A dois meses das eleições, o Superior Tribunal Militar (STM) vai passar por uma troca de comando na próxima semana que deve produzir reflexos para além da caserna. Aliado do presidente Jair Bolsonaro, o general Luís Carlos Gomes Mattos se aposentou e deixou o tribunal na última quarta-feira (27), passando o bastão conforme Malu Gaspar, do O Globo, para outro general, também do Exército: Lúcio Mário de Barros Góes.
Barros Góes é considerado por colegas militares um nome “muito equilibrado”, discreto, de perfil conciliador – e politicamente “neutro”, pelo menos até hoje.
O general foi indicado ao STM em 2012 pela então presidente Dilma Rousseff e assume a chefia do tribunal em 3 de agosto, na próxima quarta-feira. Até lá, um ministro interino vai comandar a Corte.
De saída do STM, Gomes Mattos é um general alinhado aos interesses do Palácio do Planalto. Na semana passada, ele compareceu à controversa reunião em que o presidente Bolsonaro levantou suspeitas infundadas contra as urnas eletrônicas – um sistema eletrônico de votação que está em vigor desde 1996, sem nenhuma acusação de fraude comprovada até hoje.
Gomes Mattos foi o único presidente de tribunal superior que aceitou o convite do governo para a reunião com embaixadores, minimizando o isolamento do mandatário. Não por acaso, o general Braga Netto, companheiro de chapa de Bolsonaro, fez questão de marcar presença e prestigiar a solenidade de sua despedida ontem em Brasília.
O STM, convém ressaltar, não tem qualquer ingerência sobre a organização das eleições e a atuação dos militares no pleito. O próprio Gomes Mattos fez questão de ressaltar isso ontem.
“Nós temos uma Justiça Eleitoral e ela é a responsável pelo funcionamento real daquilo. Nossa missão é diferente”, disse o general a jornalistas. “Não temos que nos envolver… temos que garantir que o processo seja legítimo e tudo. Essa é a missão das Forças Armadas.”
Generais ouvidos reservadamente pela equipe da coluna avaliam que, ao contrário de Gomes Mattos, Barros Góes teria declinado o convite.
“Barros Góes é pernambucano, discreto, preparado, conciliador e de fácil trato. Não é fanático”, disse um general à equipe da coluna.
A aposta é a de que o novo presidente do STM fique “equidistante” em relação à cruzada bolsonarista contra as urnas.
Gomes Mattos, por outro lado, já demonstrou reservadamente que, assim como Bolsonaro, também tem desconfianças sobre o sistema eletrônico de votação. Para militares, ao aceitar o convite para a reunião sobre as urnas, o general acabou assumindo o lado do chefe do Executivo.
Aquela não foi a primeira demonstração de alinhamento do agora ex-presidente do STM com o atual ocupante do Palácio do Planalto.
Em entrevista à revista Veja publicada no ano passado, Gomes Mattos saiu em defesa de Bolsonaro e do ex-ministro Eduardo Pazuello e chegou a chamar o presidente da República de “democrata”. Quando foi indagado sobre a candidatura de Lula ao Palácio do Planalto, respondeu que “o brasileiro precisa saber votar”.
Gomes Mattos também provocou polêmica ao dizer que a divulgação pelo jornal O Globo de áudios com relatos de tortura durante a ditadura era “notícia tendenciosa” com o objetivo de “atingir as Forças Armadas”.
O tema da tortura também veio à tona em 2012, na sabatina de Barros Góes pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado, que aprovou a indicação de seu nome por unanimidade. Naquela ocasião, o futuro presidente do STM disse que é “absoluto e bem protegido” pela Constituição o direito do ser humano não ser torturado.
Apesar das mudanças de perfil entre os dois generais, há quem adote a postura de cautela e prefira aguardar os próximos acontecimentos.
Isso porque o ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, também era visto como um nome mais técnico e equilibrado, até assumir o comando da pasta, mudar de postura – e reforçar a narrativa bolsonarista contra as urnas.
“Não tenho bola de cristal”, resume um conhecido de Barros Góes. A conferir.