Kais Saied acusa magistrados de corrupção e de proteger suspeitos em casos de terrorismo. Críticos atribuem demissões a motivos políticos. Medida levanta temor de que a jovem democracia tunisiana esteja em perigo.
O presidente tunisiano, Kais Saied, cumpriu a ameaça de uma “limpeza no Judiciário” e demitiu 57 juízes e promotores, acusando-os de corrupção e de proteger suspeitos em casos de terrorismo. Críticos do governo atribuem as demissões a motivos políticos.
A lista dos demitidos foi publicada nesta quinta-feira (02/06). Entre eles estão um ex-procurador-geral da Tunísia, um ex-chefe do Tribunal de Cassação da capital Túnis e um ex-porta-voz da unidade especial de investigação sobre crimes financeiros e terroristas. Todos haviam sido anteriormente dispensados das funções.
A demissão dos magistrados é mais uma medida que levanta temor de que a jovem democracia da Tunísia, berço da Primavera Árabe, esteja em perigo.
Saied é professor de Direito Constitucional e foi eleito presidente em 2019 com a promessa de combater a corrupção. No entanto, desde que assumiu o poder, gradualmente derrubou instituições democráticas, terminou com a separação entre os poderes e pretende mudar a Constituição do país norte-africano, publicada em 2014.
Em decisões altamente polêmicas, declarou estado de emergência em 2021, demitiu o primeiro-ministro Hichem Mechichi e fechou o Parlamento em março de 2022.
Em fevereiro, Saied se autoconcedeu poder sobre o Judiciário, ao estabelecer um novo órgão de vigilância judicial que lhe permite demitir juízes e bloquear promoções e nomeações.
Referendo para nova constituição
Em 25 de julho de 2022, um ano após a declaração do estado de emergência, os tunisianos votarão em referendo sobre uma reforma constitucional. O novo projeto de Constituição deve ser publicado no fim de junho e, segundo o presidente, o texto deve servir de base para um novo arranque político e econômico que leve em conta os interesses das regiões e da população, mais do que o status quo anterior.
Se o texto for aprovado, um novo Parlamento será eleito em dezembro. Seus oponentes acusam Saied de golpe e temem pelas conquistas democráticas obtidas com a revolução de 2011, que depôs o ditador Zine El Abidine Ben Ali.
Saied disse no passado que as medidas visam salvar a Tunísia do colapso. No entanto, os críticos dizem que ele está guiando o país firmemente no sentido de um governo autoritário.
O diretor regional da Comissão Internacional de Juristas, Said Bernabia, criticou as demissões em uma série de tuítes. “A emenda é uma afronta à separação de poderes e à independência judicial. Por meio dela, o colapso do Estado de direito da ordem constitucional está agora completo”, escreveu Bernabia.