Enquanto o brasileiro se desdobra para abastecer, a Petrobras vê a receita superar em muito seus custos. No primeiro trimestre deste ano, a empresa lucrou R$ 44,6 bilhões, o equivalente a R$ 495 milhões por dia. Mas apenas cerca de 30% desses dividendos são repassados à União, maior acionista da empresa.
Segundo o jornal O Tempo, a maior parte acaba parando nas mãos de investidores estrangeiros, alheios ao impacto provocado pelas altas constantes nos postos de combustíveis do Brasil.
Para Rodrigo Leão, pesquisador do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep), mesmo que o lucro referente à União retornasse em subsídio para tentar baixar o preço do combustível ao consumidor final, o efeito seria pequeno.
“O valor referente à Petrobras é de aproximadamente um terço da composição do preço final do combustível. Então, se você dividir os dividendos da União entre todo o volume produzido pela empresa, vai acabar tendo um impacto muito pequeno”, explica o especialista. A Petrobras produziu, só no primeiro trimestre, 684 mil barris por dia de diesel e 374 mil de gasolina.
Segundo o especialista, para que o país possa definir uma política pública adequada para o preço do petróleo, é preciso que todos os atores envolvidos possam conversar para ver quanto cada um pode ceder, incluindo os investidores. “Não acho justo que somente o consumidor utilize seu lucro para subsidiar o combustível. O acionista também precisa ter a sua cota de sacrifício. Precisamos socializar esse processo, envolver todos os atores, incluindo as distribuidoras, os postos de gasolina e os Estados”, argumenta. Em 2021, a Petrobras teve um lucro histórico de R$ 106,6 bilhões.
Leão lembra ainda que a Petrobras paga altos impostos (foram cerca de R$ 70 bilhões no primeiro trimestre deste ano) e é uma das maiores empregadoras do Brasil, mas vem deixando de investir em projetos sociais, culturais e ambientais nos últimos anos.
Muitos componentes para o preço
A precificação da gasolina e óleo diesel, por exemplo, é impactada pela cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), que é calculado em percentuais diferentes por cada Estado, e da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE), Pis e Cofins – de responsabilidade da União.
Atualmente, tramita no Congresso um projeto de lei com propostas para amortecer os aumentos constantes dos combustíveis. Entre elas, está a criação de uma Conta de Estabilização de Preços de Combustíveis (CEP-Combustíveis), um fundo abastecido com receitas do setor de petróleo e gás.
Também pesquisadora do Ineep, Carla Ferreira defende a criação de um fundo para subsidiar o preço final dos combustíveis e diminuir o reflexo para o consumidor final. “Seria um fundo de estabilização que pudesse ser alimentado com um imposto sobre as exportações de óleo cru (do pré-sal, por exemplo). Ele poderia amortecer as oscilações internacionais de preço. Além disso, o estabelecimento de um tributo de alíquota variável. Se o preço está alto, você reduz a alíquota internamente”, afirma Ferreira.
Mudança no ICMS seria uma opção
A queda de braço entre governos federal e estaduais é mais complexa. A cobrança de ICMS pesa muito na composição de preços dos combustíveis (para gasolina, a média é de 27%), mas também é a principal fonte de arrecadação para boa parte dos Estados. Para evitar uma escalada ainda maior nos preços cobrados nas bombas, o valor de referência do imposto (reajustado conforme a atualização dos valores repassados ao consumidor) está congelado pelos Estados até o final de junho.
Na avaliação do professor de Direito Tributário da UFMG Paulo Coimbra, uma alternativa para baixar o preço dos combustíveis no Brasil seria uma Lei Complementar que limitaria a alíquota do ICMS dos estados. O texto teria de ser editado pelo Governo Federal e aprovado no Congresso Nacional.
Por se tratar de um serviço essencial, Coimbra sugere um percentual do ICMS abaixo de 18%. Em Minas, por exemplo, o índice sobre a gasolina chega a 30%. “Pode até se prever um período de transição gradual até que a arrecadação seja compensada pelo aumento do consumo ou com alguma compensação vinda da União”, exemplifica Paulo Coimbra.
O professor também sugere a extinção da Cide. A contribuição foi criada em 2001 para ser calculada sobre atividades de importação e comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus derivados, e álcool etílico combustível.
“A Cide não existia quando foi editada a Constituição Federal de 1988 e uma medida que poderia contribuir é a extinção do imposto. A União tem superávit é o ente federativo que mais arrecada”, diz.
Por meio de nota, a Petrobras afirmou que “reitera seu compromisso com a prática de preços competitivos e em equilíbrio com o mercado, acompanhando as variações para cima e para baixo, ao mesmo tempo em que evita o repasse imediato para os preços internos da volatilidade, ou seja, evita o repasse das variações temporárias que podem ser revertidas no curto prazo. Como exemplo, podemos citar variações circunstanciais do preço do petróleo e da taxa de câmbio”.