A principal estratégia adotada pelo ministro Luiz Fux ao chegar à presidência do Supremo Tribunal Federal (STF) para frear as sucessivas derrotas da Lava Jato na corte está parada no tribunal.
Em outubro do ano passado, menos de um mês após assumir o comando do Supremo, Fux conseguiu conforme a Folha de S. Paulo, aprovar uma mudança no regimento que transferiu para o plenário a competência para julgar inquéritos e ações penais.
A ideia era retirar a Lava Jato da alçada da Segunda Turma, que tem maioria crítica aos métodos da operação, e usar o plenário virtual para dar celeridade à tramitação das investigações.
Os ministros com perfil contrário às apurações iniciadas em Curitiba, porém, não têm aceitado analisar processos criminais no ambiente online.
Quando esses casos são levados para o plenário virtual, os magistrados costumam pedir o chamado destaque, o que interrompe o julgamento e obriga que o assunto seja retomado em sessão do plenário físico.
Assim, 250 dias depois da aprovação da mudança no regimento, os 11 ministros não se reuniram em sessão presencial nenhuma vez para julgar processos relativos à Lava Jato. Nesse período, o único processo criminal analisado pelo plenário físico do STF foi o do deputado Daniel Silveira (PSL-RJ).
Em fevereiro, os magistrados referendaram a decisão do ministro Alexandre de Moraes de prender o parlamentar em flagrante por causa de um vídeo publicado nas redes sociais em que ele fez ataques e ameaças a integrantes do STF. Depois, em abril, a corte aceitou por 11 a 0 a denúncia da PGR (Procuradoria-Geral da República) contra Silveira.
Um exemplo da resistência em usar o plenário virtual para destravar a Lava Jato ocorreu em fevereiro, quando os ministros começaram a julgar a acusação que ficou conhecida como “Quadrilhão do MDB”, em que foram denunciados nomes da cúpula do partido, como José Sarney, Renan Calheiros, Romero Jucá, Edison Lobão e Jader Barbalho.
O ministro Dias Toffoli pediu destaque e retirou o processo do ambiente virtual. O magistrado liberou o caso para julgamento no início de junho, mas ainda não há data para que a análise do tema seja retomada.
O mesmo ocorreu na ação penal contra o deputado Silas Câmara (Republicanos-AM). O julgamento é considerado importante porque envolve uma acusação de “rachadinha” e pode servir de parâmetro para eventual análise do caso do senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ).
O filho do presidente foi denunciado pelo MP-RJ (Ministério Público do Rio de Janeiro) sob acusação de ter arrecadado parte do salário dos servidores de seu gabinete quando era deputado estadual.
Os ministros Luís Roberto Barroso e Edson Fachin votaram para condenar o deputado a cinco anos e três meses de prisão por peculato. O ministro Kassio Nunes Marques, porém, interrompeu o julgamento para remetê-lo ao plenário físico, o que ainda não tem data para ocorrer.
O julgamento que pode culminar na prisão do ex-deputado André Moura (PSC-SE) também está pronto para ser julgado pelo plenário do STF, mas ainda não tem data marcada para ocorrer.
O STF aceitou as denúncias apresentadas pela PGR (Procuradoria-Geral da República) contra o político há seis anos e ainda não decidiu se ele deve ser condenado ou absolvido por crimes que teria cometido na Prefeitura de Pirambu (SE).
Os ministros de perfil mais garantista, que costumam criticar a Lava Jato, têm aceitado julgar virtualmente apenas casos que não envolvam condenações ou decisões mais graves.
Neste mês, os ministros rejeitaram, no ambiente online, recurso que pedia a reversão da ordem de enviar uma investigação contra o ex-deputado Eduardo Cunha (MDB) à primeira instância.
O presidente Luiz Fux tem afirmado que priorizou no primeiro semestre o julgamento de temas econômicos para dar segurança jurídica à retomada do PIB após a crise desencadeada pela pandemia da Covid-19 e que, na segunda metade do ano, irá pautar temas criminais no plenário físico.
“A alteração não trouxe nenhum prejuízo para o prosseguimento das investigações nos gabinetes, que seguem o ritmo das apurações normalmente conforme os critérios próprios e as determinações e prazos legais”, afirmou a presidência do STF por meio de nota.
E completou: “Atualmente, há cinco ações penais liberadas para a pauta do plenário físico, e o presidente Luiz Fux vai priorizá-las na pauta do segundo semestre”.
A análise de ações penais marcará o retorno desses processos ao plenário. A transferência da competência para julgar investigações criminais iniciadas no STF para as turmas ocorreu em 2014.
Na época, o mensalão havia ocupado seis meses do plenário e impedido a análise de outros temas importantes pelo conjunto de ministros. Por isso, o Supremo decidiu transferir esses casos para as duas turmas, compostas por cinco magistrados cada uma, a fim de dar celeridade a esses casos.
Desde o início da Lava Jato, porém, a atribuição para julgar as investigações iniciadas em Curitiba foram direcionadas à Segunda Turma, onde estava Teori Zavascki, que era relator da operação no Supremo.
Com o passar dos anos, porém, houve mudanças na composição do colegiado, que ganhou um perfil muito crítico aos métodos usados pelo Ministério Público Federal e pelo ex-juiz da Lava Jato Sergio Moro.
Devido à sequência de derrotas que os magistrados vinham impondo à operação na Segunda Turma, Luiz Fux iniciou uma articulação assim que assumiu a presidência do STF para determinar o retorno desses casos ao plenário.
Fux conseguiu maioria entre os colegas nos bastidores para mudar o regimento e confirmar a retirada das ações penais e inquérito das turmas. Ele pautou a proposta de alteração regimental sem avisar Gilmar Mendes, principal crítico da Lava Jato no Supremo.
“De fato não faz sentido a gente chegar do almoço e receber a notícia de que tem uma reforma regimental”, reclamou Gilmar.
O ministro queixou-se da forma como Fux levou o caso para análise na sessão administrativa da corte, mas votou a favor da mudança no regimento, que foi aprovada por unanimidade.