Empossado há menos de um mês, o ministro da Cidadania, João Roma, reconhece que o valor do auxílio emergencial, anunciado na última quinta-feira (18) não é o “ideal” e nem suficiente para deixar a população mais vulnerável em casa no pico da pandemia de Covid-19 no Brasil.
Em entrevista ao ao jornal O Globo, Roma afirma que o valor médio de R$ 250 é o que foi “possível” de alcançar, diante da necessidade de manter a responsabilidade fiscal. Pessoas que moram sozinhas receberão R$ 150. Mães solo, R$ 375.
Os pagamentos começarão em abril. O ministro diz que 46 milhões de famílias receberão o benefício, após cruzamentos de dados feitos pelo governo.
Roma afirmou ainda que o governo irá aumentar o valor do Bolsa Família, que paga hoje em média R$ 190. Isso ocorrerá a partir de agosto, após o fim do auxílio. Ele disse que o novo valor ainda não foi definido. Mais famílias também serão inseridas no programa.
Leia a íntegra da entrevista:
O valor do auxílio é bem mais baixo que do ano passado. Por quê?
A limitação foi uma exigência da responsabilidade fiscal do governo. A situação econômica está delicada. Na votação da PEC (que permitiu o pagamento do auxílio) ocorreu até uma movimentação para que se excluísse o Bolsa Família do teto de gastos (regra que limita as despesas da União). Só isso causou uma movimentação brusca no mercado. A política social e a política econômica são duas faces da mesma moeda. Quando existe qualquer oscilação mais grave, qualquer piora na área econômica, quem primeiro e mais sofre é a população mais vulnerável, a população mais pobre.
Com base nisso, esse foi o montante que foi possível se viabilizar, totalizando R$ 44 bilhões, para o pagamento do auxílio emergencial em 2021. Com base nesses valores e numa estimativa de pelo menos quatro meses, essa foi a equação de conseguimos. É o ideal? É o pretendido? Não. Mas é o que foi possível de ser viabilizado pelo Estado brasileiro.
O auxílio é necessário para que os mais vulneráveis fiquem em casa e se protejam. Os valores de R$ 150, R$ 250 e R$ 375 são suficientes para essas pessoas ficarem em casa?
Não. Mas é mais do que necessário, é de fundamental importância para aliviar o sofrimento dessas famílias. Em comparação a uma família de classe média, parece ser uma quantidade pequena de recursos. É o ideal? Óbvio que não, mas é o que foi possível alcançar. E, sem dúvida nenhuma, para essas pessoas, fará uma enorme diferença para o seu sustento e para aliviar esse momento de muito sofrimento que passa, em especial essas camadas menos favorecidas.
Por que o número de beneficiários caiu em relação ao ano passado?
É fruto do cruzamento de várias fontes de dados, e é um aprimoramento do auxílio emergencial. Na primeira rodada do auxílio, o pagamento atingiu cerca de 68 milhões de famílias, e terminou em dezembro com cerca de 55 milhões. Agora nós chegamos a um número de 46 milhões. Houve uma evolução, especialmente em relação ao grau de informação e do cruzamento de dados. No ano passado coletou-se informações de cerca de 150 milhões de CPFs. Mas vários furos ocorreram.
Quando os pagamentos vão começar?
Na próxima semana nós vamos publicar o calendário com todas as informações acerca do recebimento do auxílio emergencial, que será feito de forma cadenciada. Deve ter início no início de abril. Vamos começar pagando para o público que não está no Bolsa Família.
E como as fraudes serão prevenidas?
Dois quesitos pesaram contra o auxílio no ano passado. Um foi a impossibilidade de eficácia total do Estado em identificar o destinatário, o que resultou em pagamentos indevidos. São muitas regras e itens que foram corrigidos em relação a isso. E outro item foram as fraudes. Hoje nós temos mecanismos para cruzar e atestar informações. As informações estão cada vez mais cruzadas.
O auxílio poderá durar mais de quatro meses?
Como estará o Brasil no mês de julho? Não sabemos. Para ampliar isso precisaria de uma nova PEC e uma nova parcela de recursos. Hoje, o roteiro do ano de 2021 é: quatro meses de emergencial — abril, maio, junho e julho —; o Bolsa Família é estruturado e ampliado — agosto, setembro, outubro, novembro e dezembro. Vamos executando essas tarefas e auscultando o que vir da nossa sociedade.
Como o ministério está se planejando para evitar aglomerações nas agências?
Com informação. Nós já trabalhamos o calendário e vamos transmitir isso da forma mais clara possível para que o cidadão evite ir para filas pedir informações, porque as informações já estarão nas redes sociais, veículos de mídia. Como temos também uma população que já percebeu e vivenciou esse processo no ano passado.
Qual o plano do ministério para atender a população depois de julho, quando acaba o auxílio?
Minha prioridade até o momento era ser eficaz e cumprir bem a missão do pagamento do auxílio emergencial. Com isso engrenado, temos outro planejamento pela frente, que é a reestruturação e ampliação do Bolsa Família. Nós pretendemos que o valor aumente e queremos rever o programa para que ele seja mais efetivo. Talvez, com alguns outros ingredientes. Estudamos aliar o benefício financeiro a outras políticas públicas.
A ideia é ampliar o programa para atender mais famílias?
Nós buscamos que o programa seja um pouco mais abrangente, porque existe fila para entrar no Bolsa Família. Batemos recorde de 14,5 milhões de famílias hoje (na folha de março). Vamos nos debruçar sobre isso, porque nós pretendemos ampliar.
Também pretendemos elevar esse tíquete médio, que hoje é de R$ 186, aproximadamente, para algo mais. Não temos como falar em valores porque precisamos obter dados para processar isso, saber qual vai ser esse universo (de pessoas).
Seria um meio-termo entre o universo de pessoas que recebem auxílio emergencial e as que recebem o Bolsa Família?
Não se pode dizer isso. O que podemos dizer é que o governo pretende que essa reestruturação e ampliação do Bolsa Família sirva como um anteparo para que não ocorra uma queda tão brusca ao final dos quatro meses de auxílio em 2021. Ou seja, quando chegar o mês de agosto, ampliando um pouco o Bolsa Família, isso possa servir para amortecer (o final), uma vez que o Bolsa Família também está vinculado aos mais vulneráveis.
Como encontrar espaço no Orçamento para aumentar o Bolsa Família?
Vamos dentro da estrutura orçamentária. Não pretendemos furar teto para o Bolsa Família. Hoje, o Orçamento do Bolsa Família é de R$ 35 bilhões para o ano de 2021. Ocorreu um acréscimo de R$ 44 bilhões de auxílio emergencial. Com a economia dos quatro meses de auxílio, é possível turbinar o Bolsa Família nos últimos cinco meses do ano.
Em 2022, nós vamos ter que encontrar um valor equivalente no Orçamento do governo. Isso vai fazer com que esses R$ 35 bilhões sejam insuficientes em 2022. Ou seja, em 2022 o valor destinado ao Bolsa Família será superior e o governo terá que cortar de outras áreas. Essa é uma discussão que tem sido feita de forma transparente, envolvendo a área econômica.
No ano passado, a discussão sobre o Renda Brasil incluía a eliminação de programas sociais, como abono salarial e seguro-defeso. Essa discussão está descartada?
Cheguei recentemente ao governo, mas dentro dessas conversas não ouvi nenhuma versão sobre mexer com programas sociais. A ideia é fortalecer e ampliar o Bolsa Família.
Dá tempo até agosto mandar e aprovar no Congresso até agosto?
Vai ter que dar. Essa é a nossa missão.
Qual vai ser a estratégia para colocar mais pessoas no Bolsa Família?
Não é que a estratégia seja colocar pessoas no Bolsa Família. A estratégia é criar uma rede de amparo para aqueles que de fato necessitarem estar no Bolsa Família. Não vou sair buscando, prospectando. Fica parecendo que a política pública é buscar o empobrecimento das pessoas. Não é uma busca ativa, é ter o arcabouço, estar preparado, com essa rede de assistência e suporte para a população mais vulnerável.
O Bolsa Família tem hoje uma série de condicionantes, como ter escola em dia. Tudo isso continua? Haverá novos critérios?
Pode ser acrescentado ou suprimido (algum critério). O que se pretende nesse novo estudo é dar uma sistematizada nisso.
Tem algum critério que pode entrar ou sair?
Não dá para falar agora.
O nome vai mudar?
Não falamos sobre isso ainda aqui no ministério. É uma possibilidade. Acho que o foco não é mudar de nome. Mas é possível que ocorra um ajuste.