A conselheira Maria Tereza Uille Gomes, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), derrubou nesta segunda-feira (7) uma decisão dela própria que havia determinado que o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) encaminhasse a um de seus magistrados um funcionário exclusivo para ajudá-lo durante o home office. O caso, revelado na edição desta segunda-feira do Estadão, repercutiu negativamente no CNJ.
Integrantes do órgão avaliam que a conselheira, que sempre se preocupou com a questão de direitos humanos durante a carreira, tomou uma decisão controversa, interpretada como mais uma “regalia” à magistratura. E o pior: em plena pandemia do novo coronavírus, quando a Organização Mundial da Saúde (OMS) e autoridades sanitárias de todo o mundo recomendam o distanciamento social para evitar a disseminação da doença.
A decisão de Maria Tereza havia sido tomada em favor do desembargador Carlos Alberto Lopes. Maria Tereza exigiu que o TJ paulista providenciasse alguém para essa missão que “já tenha sido infectado pela covid-19 e esteja recuperado da doença”. Para a conselheira, a situação de Lopes é “peculiar”, já que ele faz parte do grupo de risco da covid-19 (por ter 72 anos) e vive com pessoas idosas.
Um dos pontos destacados pela conselheira é a de que o prédio do TJ de São Paulo está funcionando somente no período da tarde, das 13h às 17h, enquanto as sessões de julgamento do desembargador vinham sendo realizadas no período da manhã, o que, na sua visão, justificaria a ajuda de um auxiliar nos julgamentos online. Com o tribunal só funcionando à tarde, o magistrado não tinha acesso ao seu gabinete de trabalho no início do dia para participar das sessões.
“Na sexta-feira, dia 4/9/2020, em contato telefônico com o Presidente do Tribunal de Justiça, fui informada que o Tribunal de Justiça de São Paulo havia resolvido a questão, dentro de sua esfera de autonomia, com a mudança de horário da sessão virtual de julgamentos, do período da manhã para o início da tarde, de forma a permitir a participação do magistrado”, escreveu a conselheira.
“Entendo atendido o interesse público da sociedade de ter seus processos julgados por meio da composição integral da Câmara. Assim sendo, torno sem efeito a necessidade de qualquer outra medida no caso concreto”, concluiu Maria Tereza.
Em tese, para proferir decisões e registrar seus votos, todo desembargador deveria saber lidar com o sistema de processo digital do tribunal, até para poder usar a assinatura eletrônica.
Na primeira decisão, Maria Tereza determinou que, assim que fosse escolhido o funcionário para atender Lopes em casa, o tribunal deverá oferecer os meios necessários para que o mesmo tenha “condições de contato com a equipe do gabinete do desembargador e de promover suporte ao magistrado, para fins de realização de seus deveres funcionais”.
“Funcionário exclusivo”. Segundo o Estadão apurou, logo no começo da pandemia, quando o TJ-SP decidiu adotar o trabalho virtual, o desembargador teria recorrido contra a medida ao presidente do tribunal, que negou seu pedido. Lopes alegava ter necessidade de um “funcionário exclusivo” para assessorá-lo.
De acordo com a assessoria do tribunal, o pedido de trabalho presencial estava em “absoluta dissonância com a recomendação de isolamento social”. O TJ-SP afirma que as mudanças promovidas no modo de trabalho tiveram o objetivo de preservar o bem-estar e a saúde de todos. “O tribunal insiste que os protocolos estabelecidos devem ser seguidos por todos.” Há 360 desembargadores no TJ-SP.