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quarta-feira 19 de agosto de 2020 às 11:08h

Audiência pública solicita tombamento do Abaeté como Patrimônio Histórico e Cultural da humanidade

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“O tombamento é um ato político para preservação do patrimônio!”, destacou representante da Fundação Gregório de Matos

Moradores de Itapuã, lideranças religiosas de terreiros de candomblé,lideranças comunitárias, ambientalistas, ex-lavadeiras, ativistas sociais, pesquisadores, antropólogos e professores aproveitaram o Dia Nacional do Patrimônio Histórico e Cultural comemorado em 17 de agosto no país para solicitar o tombamento do Abaeté como Patrimônio Histórico e Cultural Material e Imaterial da humanidade junto à Fundação Gregório de Matos, durante audiência pública realizada, na tarde desta segunda-feira (17), pela Câmara de Vereadores, por meio da Comissão de Desenvolvimento Sustentável, presidida e conduzida pelo vereador Marcos Mendes (PSOL).

Mendes ressaltou que a obra da estação elevatória de esgoto é mais um exemplo do racismo estrutural, ambiental e religioso que atinge as comunidades tradicionais, quilombolas, indígenas e terreiros de candomblé que são vítimas da especulação imobiliária e de diversos tipos de violências físicas e símbólicas. “Não podemos permitir que esse tipo de política feita de cima para baixo, sem diálogo com as comunidades, tenha continuidade. Não podemos cruzar os braços diante desses desmandos. A estação elevatória de esgoto é uma obra de 2009 e deveria se reportar ao Código Florestal antigo que é mais restritivo do que o Código atual vigente. E não é isso o que está ocorrendo. Apoiamos esse desejo da comunidade de solicitar o tombamento do Abaeté por entendermos que é um patrimônio simbólico, cultural e histórico de extrema importância à cultural local e que precisa ser preservado pelos poderes públicos”, destacou o vereador Marcos Mendes(PSOL), ao ressaltar que já protocolou representação junto ao Ministério Público, Conder, Sedur, Inema e Embasa para que a concepção da obra seja alterada.

A representante da Fundação Gregório de Matos, Milena Luisa, ao fazer referência à Lei 8.550 de 2014, avaliou durante a audiência que o pedido de tombamento do Abaeté pela comunidade, ambientalistas e ativistas sociais, apresenta-se como “adequado e pertinente”. A técnica salientou que o patrimônio para fins de preservação é constituído por bens culturais cuja proteção deve ser de interesse público pelo reconhecimento social no conjunto das tradições passadas e contemporâneas. A antropóloga esclareceu que, além do pedido de tombamento, a comunidade pode solicitar também o registro no Livro Especial dos espaços destinados às práticas coletivas. “O tombamento é, acima de tudo, um ato político. O tombamento vai reforçar a questão da preservação da APA e o registro no Livro Especial vai promover o Plano de Salvaguarda que visa estabelecer políticas públicas para preservar todos esses elementos culturais que deverão ser mapeados, caso ainda não tenham sido, para devida instrução técnica”, esclareceu a representante da Fundação Gregório de Matos.

A representante do Fórum Permanente de Itapuã(FPI) e mestranda em Antropologia pela Universidade Federal da Bahia(UFBA), Clara Domingas, salientou que a obra da estação elevatória de esgoto no Abaeté representa o modelo de “economia desenvolvimentista” que não dialoga com a sociedade civil e que irá trazer danos irreversíveis, com possibilidade de ocasionar uma desertificação da lagoa. “O Conselho Gestor da APA não foi nem consultado. Essa é uma obra indefensável que vai trazer prejuízos irreversíveis ao nosso território”, lamentou.

A pesquisadora frisou que o Abaeté não é concebido como um “sítio isolado”. Muito pelo contrário, é compreendido a partir de uma biodiversidade local, de uma relação existente entre os sítios patrimoniais da região. “Temos paisagem e cultura numa trama só. Itapuã é símbolo de abundância para o mundo”, frisou a “nativa” e itapuãnzeira Clara Domingas, ao defender que o tombamento do Abaeté deve ser acompanhado pelo tombamento de outros sítios patrimoniais como o Morro do Vigia, o Cemitério de São Francisco, a pedra de São Thomé, entre outros.

Baianas de acarajé, capoeira e quilombo

A audiência pública virtual que discorreu sobre “Sustentabilidade, diversidade cultural e patrimônio histórico” foi aquecida também pelos relatos de Rita Santos, Presidente da Associação Nacional das Baianas de Acarajé(ABAM) que defendeu o tombamento das baianas a nível municipal, na capital baiana. ” Nós somos patrimônio nacional estadual, mas, infelizmente, não somos patrimônio municipal. A Câmara de Vereadores aprovou o projeto que tornava as baianas de acarajé de Salvador patrimônio da cidade, mas o prefeito ACM Neto não acatou”, protestou a Presidente da Associação Nacional das Baianas de Acarajé(ABA), ao frisar que diversas baianas estão vindo à óbito por causa da fumaça exalada pelo dendê e reivindicou políticas públicas que promovam mudanças no processo de colheita do dendê.

Representantes da comunidade quilombola do Quingoma, localizada em Lauro de Freitas, denunciaram que, devido à especulação imobiliária na região, as propriedades onde residem secularmente são invadidas por grileiros, os moradores são com recorrência ameaçados com armas de fogo e até um cemitério pretendem construir em frente ao terreiro de candomblé da comunidade remascente de quilombo fato este considerado como uma afronta e total desrespeito à ancestralidade e cultura local. “As famílias estão desesperadas! Nós saímos de casa e não sabemos se vamos voltar. Precisam respeitar o quilombo do Quingoma. Fazemos parte da história e memória do Estado e do país. Nossa Mata Atlântica está sendo retirada. Os rios estão sendo aterrados”, denunciou a yalorixá dona Donana, representante do Quingoma.

A audiência contou com participações de capoeiristas que atuam em movimentos de valorização da capoeira representados pelo mestre Duda, além de acadêmicos como o arquiteto e urbanista Dr Paulo Ormindo, o antropólogo e professor da UFBA, Ordep Serra, a advogada, militante e ativista pelo tombamento da Pedra de Xangô, Maria Alice Pereira e o IPAC que foi representado pelo Diretor Geral, João Carlos. Após a audiência pública será iniciado o processo de levantamento de dados, coleta de relatos orais, entre outros procedimentos técnicos necessários ao tombamento do Abaeté pelos orgãos públicos.

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