O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), vai criar, nos próximos dias, um grupo de trabalho para propor mudanças na forma de financiamento, compras e fiscalização do Sistema Único de Saúde (SUS). Segundo a deputada Margarete Coelho (Progressistas-PI) afirmou ao jornal Estado de SP, a escalada para comandar o colegiado, o acesso universal e gratuito, pilar do modelo do qual dependem 150 milhões de brasileiros, não deve ser afetado. Maia tem dado prioridade à agenda social, o que o fortalece perante sua base de apoio na Câmara no momento em que tenta influenciar na escolha do seu sucessor ao comando da Casa.
A eleição será em fevereiro, mas as negociações políticas já começaram, e o presidente Jair Bolsonaro entrou em campo para emplacar um nome do seu grupo e escantear Maia. Não à toa, o deputado colocou em votação na semana passada a prorrogação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundeb), o que agradou a partidos de oposição, que serão fiéis na balança na escolha do novo presidente da Casa. O governo tentou adiar a votação e não conseguiu capitalizar a medida que aumentou o dinheiro federal repassado à educação pública. Aliada de primeira hora, a deputada Bia Kicis (PSL-DF) perdeu o cargo de vice-líder por votar contra.
A prioridade agora será o SUS, disse na publicação. Maia propõe aprimorar o sistema de saúde no momento em que o governo é criticado por integrantes do Judiciário, do Tribunal de Contas da União (TCU) e congressistas pela resposta dada à pandemia da covid-19. Maia é colega de partido de Luiz Henrique Mandetta, que deixou o comando do Ministério da Saúde em abril por divergências com Bolsonaro. O ex-ministro tem dito que pode se candidatar ao Palácio do Planalto em 2022 e que terá a defesa do SUS entre suas bandeiras.
Mandetta não chegou a enviar ao Congresso propostas de mudança na legislação do SUS quando estava no governo, mas se tornou um garoto-propaganda dele ao aparecer em entrevistas coletivas para comentar as ações de combate ao novo coronavírus com um colete do SUS.
Em entrevista à Rádio Eldorado na sexta-feira passada, Maia disse que era “crítico”, mas reavaliou a posição sobre o SUS na pandemia. “Convidei uma deputada para, junto com esse grupo, preparar um texto para que a gente possa ter uma nova legislação sobre o SUS, reafirmando a importância que o SUS teve, principalmente neste momento de pandemia”, afirmou.
Não é a primeira vez que Maia tenta pautar discussões em áreas sociais. Em 2019 o presidente da Câmara escalou um grupo liderado pela deputada Tabata Amaral (PDT-SP) para apresentar uma série de propostas de combate à pobreza, educação, trabalho, geração de renda e saneamento básico. Entre as medidas, está a reformulação do Bolsa Família. Criado no governo petista, o programa deve ser rebatizado por Bolsonaro de “Renda Brasil”.
Financiamento
Segundo a deputada Margarete Coelho, que vai comandar o grupo de trabalho na Câmara para discutir o SUS, ainda não há uma proposta pronta, mas a ideia é que sejam definidas novas regras para licitação, responsabilidade fiscal e teto de gastos. “Maia me deu dez dias para montar um plano de trabalho. A pandemia mostrou a importância do SUS. Responde bem em algumas coisas e outras podem melhorar”, disse a parlamentar.
De acordo com Margarete, sua intenção é fazer uma discussão nos moldes do debate sobre o pacote anticrime, “bem colaborativa”. “A Câmara já debateu muito o SUS. Está na hora de dar uma reorganizada”, afirmou a deputada do Progressistas, que também coordenou a comissão formada para analisar as propostas enviadas pelo ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Sérgio Moro, no ano passado.
Deputados de comissão criada para tratar da pandemia da covid-19 reclamam que só souberam pela imprensa sobre a ideia de Maia. “Não faz sentido abrir essa discussão de forma isolada. Tem muita coisa que precisa mudar, mas tem de relacionar com o combate à covid-19”, disse a deputada Mariana Carvalho (PSDB-RR), que compõe o colegiado sobre a pandemia na Casa.
Segundo Margarete Coelho, parlamentares e entidades serão chamadas ao debate após Maia aprovar o plano de trabalho. “Tenho pedido paciência. O assunto é muito extenso. Há muitos interesses e militância”, disse ela.
A fatia assumida pelo governo federal no financiamento de ações do Sistema Único de Saúde (SUS) caiu de 2002 pra 2019, mostrou reportagem publicada pelo Estadão em 5 de abril. No início da série histórica, a União arcava com 52% das contas; hoje, paga 43%. Apesar de, na média nacional, o governo federal ainda ser o maior patrocinador do sistema de saúde pública, o que se observa é uma crescente participação dos demais entes federativos. São 11 os Estados que já superam a União. O governo do Acre, por exemplo, arca com 56% ante 30% de verba federal.