O veto parcial do presidente da República, Jair Bolsonaro, ao projeto que atualiza o novo Marco Legal do Saneamento Básico (PL 4.162/2019), sancionado nesta última quarta-feira (15), foi recebido com críticas pelos senadores. Ao todo, o texto recebeu 11 vetos em relação ao projeto aprovado pelo Senado no fim de junho. Na sessão plenária, parlamentares se disseram surpresos com a extensão dos vetos, que prejudicariam a eficácia da lei e teriam extrapolado os acordos celebrados com o governo para a aprovação da matéria.
O Marco Legal do Saneamento Básico facilita privatizações no serviço de saneamento, prorroga o prazo para o fim dos lixões, e estabelecer cobertura de 99% para o fornecimento de água potável e coleta de esgoto para 90% da população até o fim de 2033.
O novo marco torna obrigatória a abertura de licitação, envolvendo empresas públicas e privadas, para contratação de companhias de água e esgoto, com prazo para efetivação dos serviços até 31 de dezembro de 2033. Essa efetivação será de 99% no caso do fornecimento de água potável e de 90% na coleta e tratamento de esgoto.
Para que as cidades encerrem os lixões a céu aberto, o prazo agora vai do ano de 2021 (era até 2018), para capitais e suas regiões metropolitanas, até o ano de 2024 (era até 2021), para municípios com menos de 50 mil habitantes. A regulação do saneamento básico vai ficar a cargo da Agência Nacional de Águas (ANA), mas o texto não elimina as agências reguladoras de água locais.
Pontos vetados
O texto da lei ainda não foi publicado no Diário Oficial da União. A sanção ocorreu em cerimônia no Palácio do Planalto e contou com a participação de ministros do governo. O presidente participou por videoconferência, devido ao cumprimento do isolamento social após ter sido diagnosticado com covid-19. Na cerimônia, foi divulgado que foram vetados 11 pontos do projeto do novo marco legal do saneamento básico, mas o Palácio do Planalto divulgou apenas três.
Entre os vetos, está o trecho que permitia que estatais que prestam os serviços hoje renovassem contratos por mais 30 anos sem licitação. Também foi vetado trecho que, segundo o governo, impediria que o setor de resíduos sólidos se beneficiasse das licitações do que foi definido no marco para o esgotamento sanitário ou para água potável. E os que criavam uma nova regra para indenização de investimentos não amortizados das prestadoras de saneamento.
Na justificativa do veto parcial, o governo argumentou que os dispositivos contrariam os objetivos do marco legal, que busca promover competitividade e eficiência por meio de contratos de concessão com licitação.
Empresas estatais
O senador Otto Alencar (PSD-BA) atacou principalmente o veto à renovação de contratos sem licitação, o que, segundo ele, contrariou a palavra empenhada das lideranças do governo. Ele considera que o veto gerará dificuldades para as estatais de abastecimento de água.
— Esse é um ato contra os interesses das empresas estatais, que vai lesar muito os seus ativos, vai dificultar muito as suas ações — lamentou.
No mesmo sentido, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, sublinhou que “compromissos são feitos para serem cumpridos”.
— Nós estamos falando de entendimento, de diálogo e de conciliação há um ano e meio aqui. Eu levanto essa bandeira e tenho o apoio da maioria esmagadora dos senadores. Agora, não pode fazer entendimento e não cumprir o entendimento — disse o presidente do Senado.
O senador Rogério Carvalho (PT-SE), que votou contra o projeto, observou que os vetos presidenciais contribuem para reduzir o valor das estatais no mercado. Por sua vez, ao atribuir a Bolsonaro a responsabilidade exclusiva pelos vetos, o senador Major Olímpio (PSL-SP) reconheceu que os líderes do governo “vão até o limite do que podem” para cumprir sua palavra. E o senador Jorge Kajuru (Cidadania-GO) repercutiu a possibilidade de problemas para a Companhia Saneamento de Goiás (Saneago) em decorrência dos vetos.
O senador Eduardo Braga (MDB-AM) entende que o veto “vai contra todo o entendimento” para preservar os ativos públicos no saneamento e relembrou o compromisso que os parlamentares assumiram quando votaram a matéria.
— Que a atração do capital privado, que é super bem-vinda, não signifique vender por preço de banana ou a qualquer preço os ativos públicos.
Líder do governo no Senado, o senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE) entende que a sanção sinaliza maior abertura do saneamento para o capital privado, tendência confirmada, segundo ele, pela forte alta das ações da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) nesta data. Já o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), relator da proposta, disse esperar que os vetos possam ser derrubados no Congresso. Ele recebeu com surpresa os 11 vetos: o acordo com o governo envolvia somente três, sob a expectativa de que o texto pudesse ser aprimorado na regulamentação.
— É um tiro no pé que o governo está dando. Não foi feita sequer uma insinuação de que isso poderia acontecer — afirmou Tasso