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sábado 11 de julho de 2020 às 05:08h

Congresso tenta estancar desemprego e discute mercado de trabalho pós-pandemia

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O próximo ano começará com uma certeza: a pandemia acentuará as desigualdades sociais e a pobreza ao redor do planeta e o número de desempregados poderá atingir recordes históricos. Os prognósticos dos organismos internacionais são desoladores.

Na região da América Latina e Caribe, por exemplo, onde o Brasil ocupa lugar de destaque, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) estima que o número de desempregados vai saltar de 26 milhões, antes da pandemia, para 41 milhões ao final de 2020. A variação para mais ou menos vai depender da retração econômica mundial e seus efeitos sobre a região, conforme estudo da OIT divulgado no início do mês.

As previsões da Organização para o Comércio e Desenvolvimento Econômico (OCDE) apontam uma taxa de desemprego de 9,4% ao final desse ano para o conjunto das 38 nações filiadas. O seu último relatório sobre a evolução do mercado de trabalho mostra um cenário equivalente, e, no caso de alguns países, pior do que o registrado na crise financeira de 2008. Os gráficos do desemprego nos Estados Unidos, Canadá e Austrália apresentam curvas assustadoramente verticais até maio.

A partir da previsão de uma catástrofe, organismos internacionais e especialistas recomendam gastos com programas que preservem empregos, ajudem os mais pobres e estimulem de alguma forma a economia que despencou com a crise sanitária mundial.

— Não é hora de vender desgraça. Nós estamos fazendo o dever de casa. É claro que a pandemia preocupa muito. Mas o brasileiro está aprendendo a lidar com as dificuldades — avalia, em entrevista à Agência Senado, o senador Vanderlan Cardoso (PSD-GO), empresário do segmento de alimentação e bebidas não alcóolicas.

Ele foi relator da Medida Provisória 936, publicada em abril desse ano, que viabilizou a redução da jornada de trabalho, dos salários e a suspensão temporária dos contratos trabalhistas. No último dia 6 de julho, depois de aprovada no Congresso, a MP foi sancionada com 13 vetos pelo presidente Jair Bolsonaro e transformada na Lei 14.020/2020, publicada no dia seguinte no Diário Oficial da União (DOU).

Resultados

O Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda (Pemer), como foi intitulado, tem cumprido o seu papel. As regras para os acordos entre empregados e empregadores possibilitaram a preservação de quase 12 milhões de empregos, segundo os últimos dados do Ministério da Economia. Mesmo assim, o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) registra que cerca de 1,5 milhão de empregos formais foram perdidos no trimestre terminado em maio.

A deterioração do mercado formal, entretanto, teria sido bem maior sem o Pemer, que vai vigorar até 31 de dezembro de 2020, ou seja, enquanto o estado de calamidade pública (Decreto Legislativo 6/2020) estiver em vigência. É o que avaliam tanto representantes de empresários quanto de trabalhadores:

— A medida surtiu efeito. Não posso quantificar. Mas conheço muitas empresas, especialmente da área de serviços, como restaurantes, academias, salões de beleza, que se utilizaram da MP. Algumas suspenderam os contratos por um a dois meses. Agora, nesse retorno, puderam contar com seus empregados, alguns deles formados e treinados pelas próprias empresas — relata o senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), que foi empresário por 40 anos e se declara otimista com as perspectivas do país.

Quem paga o benefício emergencial instituído pelo Pemer é a União. Em nota técnica divulgada no dia 6 de julho, a Instituição Fiscal Independente (IFI) estima que, pelas regras originais da MP 936 para acordos com duração até no máximo 90 dias, o custo para os cofres federais seria de R$ 26,1 bilhões. O valor liberado ainda está bem abaixo desse montante. Até 9 de julho, era de R$ 15,2 bilhões, pelos dados disponíveis no site do Tesouro Nacional.

Segundo o analista da IFI Alessandro Casalecchi, autor do estudo, há recursos para o governo prorrogar o benefício. O crédito extraordinário aberto no Orçamento da União é de R$ 51,6 bilhões. Se for estendido por mais 30 dias, o custo será de R$ 35 bilhões. Subirá a R$ 43,8 bilhões, se valer por 60 dias. E só ultrapassará os recursos orçados se for estendido a 90 dias, atingindo R$ 52,6 bilhões.

Prorrogação

Tudo indica que o governo deverá estender o benefício. O texto aprovado no Congresso, segundo Vanderlan, autoriza o Executivo a prorrogar por decreto o prazo para novos acordos. Para o senador, a expectativa é de que seja feito em duas etapas: a primeira por mais 60 dias e, posteriormente, por mais 30 dias.

Outra possibilidade é o governo prorrogar direto por mais 90 dias, conforme o secretário de assuntos jurídicos da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Valeir Ertle, que participou de reunião no Ministério da Economia com outras centrais sindicais na última quarta-feira (8 de julho). Na avaliação da CUT, apesar da demora, a MP foi uma proteção social que funcionou para salvar milhões de empregos do mercado formal de trabalho.

O benefício instituído pelo Pemer é calculado em cima do seguro-desemprego ao que o empregado teria direito. Uma parte disso é bancada por recursos da União, o que quer dizer por recursos arrecadados dos contribuintes, no caso dos acordos para reduzir as jornadas de trabalho e os salários em três faixas autorizadas (25%, 50% e 70%).

Apenas para facilitar o entendimento, se o seguro-desemprego for de R$ 1.045,00 (um salário mínimo), a União paga R$ 262,00 no caso da redução de 25%, R$ 523,00 nos acordos de 50% e R$ 732,00 nos de 70%. Quando a suspensão do contrato de trabalho for feita por empresas com faturamento bruto anual até R$ 4,8 milhões, onde estão incluídas as empresas menores enquadradas no Simples (o regime simplificado de tributação), o governo pode pagar o valor integral do seguro-desemprego. Para aquelas com receita bruta acima desse patamar, o governo banca 70% e os empregadores, os 30% restantes.

Outro aspecto importante do programa é a estabilidade para o empregado tanto durante a vigência do acordo quanto para o período subsequente. Portanto, se acordo foi feito, por exemplo, para um período de 60 dias, o empregador não poderá demitir por outros 60 dias, assegurando 120 dias de estabilidade ao empregado.

Vetos

A maior reclamação com relação a nova lei é que o acordo, negociado “exaustivamente” no Congresso, segundo o relator, não foi mantido. Alguns dos 13 vetos presidenciais significaram a ruptura desse entendimento, na avaliação do senador Paulo Paim (PT-RS), em entrevista à Agência Senado. Pelo menos dois deles prejudicam diretamente os trabalhadores e haverá pressão para a derrubada no Congresso.

Paim menciona a chamada “ultratividade das cláusulas das convenções coletivas ou dos acordos coletivos de trabalho vencidos ou vincendos”. Se mantido o veto a esse ponto, benefícios sociais como plano de saúde, vale-refeição, auxílio-creche, entre outros, só estarão garantidos se o sindicato da categoria conseguir renegociar as cláusulas que estavam no acordo coletivo ou na convenção. Se não, fica a critério do empregador cumprir. A outra regra vetada, acrescenta o senador, assegurava o auxílio emergencial para quem estava no final do período de validade do seguro-desemprego.

O veto mais polêmico, na opinião de Vanderlan, cancela, a partir de 2021, a desoneração da folha de pagamento para 17 setores beneficiados. O texto aprovado no Congresso prorrogava o benefício, que termina no final desse ano. As empresas podem escolher pagar percentual que varia de 1% a 4,5% de sua receita bruta como contribuição previdenciária, em vez de calcular o valor sobre 20% da folha de salários. Com isso, podem diminuir a carga tributária.

O relator da MP 936 disse que há muita pressão para incluir outros setores no rol dos beneficiados com a desoneração da folha, principalmente os mais prejudicados com a crise sanitária, como turismo, cultura, restaurantes e bares, e companhias aéreas. Para ele, o governo tem que colocar rapidamente as cartas na mesa, antes que a articulação para a derrubada do veto aumente. As manifestações nessa direção já começaram, inclusive com recentes declarações do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia.

Vanderlan sugere que o governo calcule com menor margem de erro possível o custo dessa renúncia fiscal (estimativas preliminares já divulgadas pela imprensa a situam na faixa de R$ 10 bilhões). E deixe o Congresso avaliar e negociar com as centrais sindicais e com as entidades empresariais as alternativas. Paim também é favorável à desoneração da folha para tentar salvar empresas e empregos.

Na opinião de Oriovisto, há espaço para compensar essa desoneração com um aumento na tributação sobre o lucro das empresas, como na Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). Mas o parlamentar considera inviável que possa ser reinstituído, como gostaria o ministro da Economia, Paulo Guedes, um tributo sobre transações financeiras, nos moldes da extinta Contribuição Provisória sobre a Movimentação Financeira (CPMF).

Medidas

Apesar da importância do Pemer para sustentar as vagas do mercado formal de trabalho, os três senadores concordam que o programa sozinho não é suficiente para abrandar a grave crise provocada pela pandemia do novo coronavírus. A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua, iniciada em janeiro de 2012 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), conseguiu dimensionar a força de trabalho que vai além do mercado formal, como a enorme variação de micro empreendedores individuais. A pesquisa trabalha com trimestres móveis. (Ver infográfico).

De março a maio de 2020, essa força de trabalho era representada por 98,646 milhões de brasileiros, dos quais 12,710 milhões estavam desocupados. Ou seja, sem trabalho. Com esse grande contingente de cidadãos sem ocupação e outros milhões na informalidade, o auxílio emergencial de R$ 600,00 mostrou sua eficácia.

Na opinião de Oriovisto, ajudou inclusive a reduzir as desigualdades sociais, porque o valor é superior ao do Bolsa-Família, e ativou o consumo de alimentos e bens básicos para as faixas mais carentes da população brasileira. Um balanço divulgado esta semana pelo Ministério da Economia mostra que o auxílio emergencial melhorou o padrão de vida de mais de 23 milhões de domicílios brasileiros e que o benefício está fortemente concentrado nos 30% mais pobres do país.

A questão agora é encontrar alternativas de transferência direta de renda para socorrer os mais carentes após o término do auxílio emergencial. O governo já sinalizou que quer instituir um programa de renda básica, que absorveria o Bolsa-Família.

De acordo com Paim, o Congresso tem tomado a dianteira nas medidas para amenizar os efeitos da crise nas áreas da saúde e na economia. Mas as medidas, segundo ele, precisam ser viabilizadas, caso do crédito para as micros e pequenas empresas, que emperrou pela exigência de garantias e agora está sendo revisto.

O senador alerta para a perspectiva de um 2021 “difícil”, particularmente no que toca aos trabalhadores e entidades da sociedade civil.

— Vai ser necessária muita mobilização para conter a sanha das medidas que aumentam carga horária de trabalho, reduzem renda e intensificam a desproteção dos direitos dos trabalhadores — adverte Paim.

A visão do lado dos empresários é otimista. Uma das grandes apostas é a reforma tributária que está na Câmara dos Deputados. A expectativa dos parlamentares é de que ela seja votada ainda no segundo semestre e proporcione novo ânimo para os negócios.

O fundamental, na avaliação de Oriovisto, é que a reforma possa realmente simplificar a estrutura tributária do país e dar “previsibilidade” ao empresário, reduzindo burocracia e custos e assegurando que as regras do jogo não serão alteradas no meio do caminho.

O senador não crê ser possível diminuir a carga tributária. Mas defende que ela recaia mais sobre renda e patrimônio do que sobre consumo, como tem sido. Assim beneficiaria os brasileiros mais carentes.

Se esse “dever de casa” for feito, ele aposta que o aumento da atividade econômica proporcione ela própria a retomada dos empregos.

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