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domingo 24 de maio de 2020 às 13:27h

Pobreza e falhas no confinamento ajudaram a disseminar o coronavírus no Peru

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O Peru foi o primeiro país da América Latina a adotar medidas para conter o coronavírus, mas nove semanas depois os números da COVID-19 são exorbitantes. O que deu errado?

O país de 32 milhões de habitantes fechou suas fronteiras e decretou o confinamento nacional obrigatório desde 16 de março, quando havia apenas 86 infecções. Atualmente, os casos confirmados estão perto de 110.000, os mortos ultrapassam 3.100 e apenas na última semana mais de 28.000 pessoas foram infectadas.

“O principal aqui foi o fracasso da administração. Houve falhas e improvisações do governo do presidente Martín Vizcarra”, diz Luis Benavente, diretor da consultoria Vox Populi.

O governo “teve fevereiro e março para fazer um plano estratégico [contra a pandemia] e não o fez”, acrescentou o analista à AFP.

O Peru é o segundo país da América Latina com mais casos após o Brasil e o terceiro em mortes após o Brasil e o México.

Vários fatores favoreceram a disseminação desenfreada do vírus no Peru:

 Mercados e bancos

Ao decretar o confinamento, o governo manteve atividades econômicas essenciais, incluindo a venda de alimentos nos mercados. Estes, que não adotaram nenhuma medida de proteção – ao contrário de redes de supermercados ou pequenas lojas de bairro – tornaram-se surtos silenciosos do vírus até que o governo agisse sobre o problema.

Assim, vários dos 2.000 mercados foram fechados. No mercado de frutas do distrito de La Victoria, 86% dos comerciantes tiveram resultado positivo no teste rápido para COVID-19.

“Eram comerciantes que manipulavam alimentos, uma cadeia explosiva de infecções”, diz Benavente. “Apenas dois meses depois, o estado enviou os militares para os mercados, mas já era tarde demais”.

Os bancos se tornaram outro foco de contágio. Os peruanos se aglomeraram fora das agências bancárias para receber fundos de emergência emitidos pelo governo.

As autoridades também implementaram medidas tardias nestes estabelecimentos, autorizando a retirada de pensões a partir de agora com transferências eletrônicas.

Fragilidades do sistema de saúde

Cerca de 7.500 pacientes com COVID-19 estão hospitalizados no Peru, mas devido à falta de equipamento de proteção ou negligência dos protocolos de segurança em saúde, o vírus se espalhou entre os profissionais de saúde, segundo representantes do sindicato.

Pelo menos 635 médicos e 1.200 enfermeiros contraíram a doença e 20 médicos e 12 paramédicos morreram.

Os hospitais estão saturados de pacientes. Os trabalhadores da saúde foram às ruas para denunciar a incapacidade do governo de fornecer equipamentos de proteção e testes para a COVID-19. O hospital “parece um cemitério cheio de cadáveres, os pacientes morrem em suas macas”, disse à AFP uma enfermeira do hospital Hipólito Unanue, em Lima.

 Alta informalidade

A economia peruana é uma das mais dinâmicas da América Latina, mas a informalidade representa 70% da atividade laboral. Assim, milhares de trabalhadores desobedeceram às ordens de confinamento para alimentar suas famílias.

Nas primeiras semanas da pandemia, mais de 50.000 pessoas foram presas por violar a quarentena.

As autoridades, que deixaram de publicar os números, acreditam que o enorme número de infratores favoreceu o contágio de milhares de policiais encarregados de monitorar o confinamento. Dezenas deles morreram com COVID-19.

Água potável e pobreza

Embora tenham sido lançadas campanhas de higiene para estimular a lavagem das mãos para evitar o contágio, esse esforço colidiu com uma dura realidade: milhares de peruanos em Lima e outras cidades carecem de água potável.

Na capital de 10 milhões de habitantes, 1,2 milhão de pessoas não têm acesso à água e outros três milhões a obtêm de forma racionada, disse à AFP a diretora da ONG Aquafondo, Mariella Sánchez.

No Peru, há grandes desigualdades socioeconômicas desde a colônia. A pobreza afeta 20,5% da população, segundo o Banco Mundial.

Milhares de famílias pobres deixaram as montanhas andinas ou áreas florestais e se instalaram em casas precárias e insalubres em Lima, onde sobrevivem com empregos modestos.

No bairro de Cantagallo, em Lima, habitado por famílias do grupo étnico amazônico Shipibo Conibo, 475 pessoas de um total de 656 testaram positivo para o coronavírus.

Centenas de moradores da periferia desafiaram a quarentena para caminhar de Lima até suas cidades. Muitos deles também testaram positivo para COVID-19.

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