Duramente criticados pelos Estados Unidos e pelo Brasil, os serviços médicos cubanos reaparecem, entre aplausos, para combater a pandemia de COVID-19, inclusive na Europa, dando impulso a um programa vital para o desenvolvimento da ilha.
“A possibilidade de uma pandemia é discutida desde o início deste século, e Cuba preparou seu exército de jaleco branco”, afirma Arturo López-Levy, professor da Universidade Holy Names, na Califórnia.
A revolução cubana mostra a saúde e a educação gratuitas como suas grandes realizações.
“No final da Guerra Fria, Cuba desenvolveu essa capacidade, e é lógico que seja uma ferramenta muito importante de sua política externa”, acrescenta.
Com mais de 11.000 mortos pelo novo coronavírus, a Itália é uma das 14 nações que solicitaram recentemente a intervenção do contingente Henry Reeve, brigada médica especializada em desastres naturais e epidemias.
Desde sua criação em 2005, esse grupo já serviu em 22 países, com missões como a luta contra o ebola na África, em 2014, a pedido da Organização Mundial da Saúde (OMS).
Estão agora na Lombardia, onde foram recebidos com aplausos.
Andorra também os chamou, enquanto outros países europeus os observam de perto. No principado, um dos 39 membros da brigada testou positivo para COVID-19.
A França aprovou a entrada de médicos cubanos em seus territórios ultramarinos. O plano remonta ao ano passado e, agora, chega em um momento oportuno.
Valência e outras províncias espanholas demonstraram interesse em seus serviços. O enviado da ONU à Síria também pediu o apoio de Cuba e China diante da pandemia.
“O coronavírus deu a Cuba uma nova oportunidade de exportar serviços médicos”, diz o diretor do Instituto de Pesquisa Cubana da Universidade Internacional da Flórida, Jorge Duany.
“Na Europa, havia médicos cubanos apenas em Portugal. Agora, por causa da crise, abriu-se uma oportunidade que pode deixar um legado”, aponta López-Levy.
Cuba oferece seus serviços médicos humanitários desde o início dos anos 1960.
Atingida pela crise econômica após o desaparecimento do bloco soviético, no início deste século, a ilha também começou a prestar serviços remunerados a países com recursos para estimular sua economia.
Na mira de Washington
O governo americano de Donald Trump reforçou o embargo em vigor sobre Cuba desde 1962, punindo o apoio a seu aliado venezuelano Nicolás Maduro.
Os Estados Unidos e o Brasil acusam Cuba de reter a maior parte da renda que esses países pagam aos médicos e de sujeitar os profissionais a um regime de trabalho semelhante à “escravidão moderna”.
Para o Departamento de Estado americano, “os países anfitriões que procuram ajuda de Cuba para a COVID-19 devem examinar acordos e acabar com os abusos trabalhistas”. Havana explica que a receita permite financiar seu sistema de saúde gratuito.
Cuba obteve US$ 6,3 bilhões por seus serviços médicos em 2018. Uma mudança no mapa político da América Latina a fez perder, porém, seus contratos no Brasil, Bolívia, Equador e El Salvador.
Em março deste ano, a ilha tinha 28.729 colaboradores em 59 países.
Sem trégua durante a pandemia, Washington assegura que Cuba busca, com suas missões pela COVID-19, recuperar o dinheiro perdido com os contratos encerrados.
Com o maior número de casos de coronavírus hoje, os Estados Unidos questionaram inicialmente a ajuda internacional de China e Cuba. Dias depois, Washington o apoio de Moscou para combater a pandemia em seu território.
Pode-se, então, falar de um eixo Pequim, Moscou, Havana nesta crise?
“Cuba não é uma grande potência, joga com suas alianças internacionais para contrabalançar as pressões dos Estados Unidos”, explicou López-Levy.
Enquanto isso, “se Trump enlouquecer e pedir a colaboração médica cubana, posso garantir que sim, nós ajudaríamos”, afirma o diretor da Unidade Central de Cooperação Médica de Cuba, Jorge Delgado.