Ao longo de 39 mandatos, nem todos os presidentes brasileiros tiveram a oportunidade de comemorar as ações de seus cem primeiros dias de governo. Não por falta de projetos e lançamentos de programas, mas porque seus governos não chegaram até a marca de uma centena de dias. Pelo menos, conforme reportagem de Marcelo Remigio, no jornal O Globo, quatro titulares do mais importante cargo político da República brasileira tiveram mandatos curtos, o mesmo acontecendo com duas juntas governista e militar. Ambas comandaram o país em dois períodos. Ao grupo dos presidentes de mandatos curtos se juntaram outros quatro escolhidos para o cargo, mas que nem chegaram a assumir por impedimento ou problemas de saúde.
O ex-presidente José Linhares (sem partido) chegou a 94 dias de mandato, enquanto Nereu Ramos (PSD) completou 81. Ranieri Mazzilli (PSD) somou dois períodos à frente do governo brasileiro, em 1961 e 1964, os dois com 13 dias, em governos tampões. Já Carlos Luz (PSD) entrou para a história com um mandato meteórico, apenas três dias com a caneta presidencial.
Então presidente da Câmara dos Deputados, Carlos Luz substituiu em 1955 o presidente Café Filho (PSP), sucessor de Getulio Vargas (PTB), que havia se matado durante o segundo governo. Filho, que era vice, se afastou por problemas de saúde com pouco mais de um ano de mandato, deixando vaga a cadeira para Luz. Acusado de conspirar com militares e planejar um golpe de Estado, o então deputado acabou sendo alvo de impeachment por parte dos senadores, deixando o cargo após três dias de mandato.
O plano de Luz que fracassou, aponta documentação disponibilizada pelo arquivo do Senado, pretendia impedir a posse de Juscelino Kubitschek (PSD), em janeiro de 1956. Após o episódio, Café Filho tentou voltar ao cargo, mas também foi impedido pelos senadores. Nereu Ramos, então vice-presidente do Senado, foi eleito presidente para um mandato tampão até JK tomar posse, em 31 de janeiro de 1956. Com poucos dias de administração, Ramos governou sob estado de sítio por dois meses para afastar o risco de um golpe de estado.
José Linhares foi outro presidente com mandato tampão. Seu governo sucedeu Getulio Vargas — desta vez no primeiro mandato — após ser deposto em 1945. Então no comando do Supremo Tribunal Federal (STF), Linhares assumiu o país com a missão de redemocratizar o Brasil após a ditadura de Vargas. Em pouco tempo de mandato, enfrentou a inflação, promoveu investimentos no ensino superior e atuou para a recuperação de estradas. Após sua passagem pela Presidência, voltou ao STF, sendo substituído por Eurico Gaspar Dutra.
Também permaneceram menos de cem dias no governo uma Junta Governista Provisória — apenas dez dias em 1930 — e uma Junta Militar — por 60 dias — em 1969. Ao longo de 39 governos presidencialistas, dois presidentes foram impedidos de exercer o mandato: Júlio Prestes (PRP), em 1930, que não assumiu a cadeira de chefe de Estado por causa da revolução de 1930, sendo substituído por uma junta governamental, e Pedro Aleixo (1969), vice-presidente civil de Costa e Silva impedido pelas Forças Armadas de comandar a Presidência, após o titular sofre um derrame e ser afastado da Presidência. E dois tiveram problemas de saúde: Rodrigues Alves, em seu segundo mandato (1918), e Tancredo Neves (1985).
Eleito por duas vezes, Rodrigues Alves não reassumiu o mandato por problemas de saúde, porque morreu antes de gripe espanhola em 1919. Curiosamente, Alves foi um dos ex-presidentes que mais trabalhou pela melhoria das condições sanitárias do Rio de Janeiro, tendo designado o médico Oswaldo Cruz para planejar políticas públicas de saúde de combate à febre amarela, à peste bubônica e a varíola.
Primeiro presidente após 21 anos de ditadura, Tancredo Neves também não assumiu seu mandato por doença. Escolhido pelo Colégio Eleitoral formado por Senado e Câmara em 15 de janeiro de 1985, foi internado com problemas abdominais em 14 de março e, pouco mais de um mês depois, morreu em 21 de abril de 1985. Seu vice, José Sarney, que havia assumido interinamente, é empossado presidente.