Um levantamento da Quaest mostrou, em junho deste ano, que 32% dos eleitores dos dois principais candidatos do pleito do ano passado – o atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o ex-mandatário Jair Bolsonaro (PL) – declararam não acreditar que reatariam amizades perdidas durante a campanha. Os dados constam segundo Marlen Couto, do O Globo, no livro “Biografia do Abismo” (Harper Collins), do cientista político Felipe Nunes e do jornalista Thomas Traumann, que chega hoje às livrarias.
Além disso, a obra também mostra que 25% dos brasileiros assumem que se sentiram mal se seus filhos estudassem numa escola com muitos pais com visões políticas diferentes.
De acordo com a obra, para além da agenda econômica, do debate sobre a implementação de políticas públicas, a definição do voto passou a ser também guiada pela forma como cada grupo enxerga o mundo, sobre seus valores e suas identidades.
País dividido
Os próprios brasileiros percebem como a divisão se aprofunda na sociedade. Após o pleito de 2022, 90% dos eleitores avaliaram que o país saiu mais dividido da disputa eleitoral. Quase metade dos brasileiros apontou crescimento das diferenças de visão de mundo entre homens e mulheres e entre moradores do Sul e Nordeste.
— A primeira etapa, e gente espera que o livro ajude nisso, é aceitar que que há essa polarização extrema. E isso significa aceitar que vai ter diferença na igreja, na família, nas empresas e nas instituições. Ou a gente entende isso, ou o resultado pode ser muito pior — diz Nunes.
A obra compila evidências, a partir de pesquisas de opinião Genial/Quaest, dos efeitos desse transbordamento da divisão política para o dia a dia dos brasileiros e que reforçam o fenômeno da “polarização afetiva”, no qual cresce não só a identificação com o grupo do qual se faz parte, mas também o ódio e a diferença em relação aos vistos como adversários. Os ataques golpistas de 8 de janeiro, por apoiadores de Bolsonaro, são o ápice desse comportamento.
É nesse ambiente, de polarização extrema, que os brasileiros agora escolhem o que consumir, em que escola matricular os filhos, que cantores ouvir ou mesmo que veículos de mídia acompanhar ou não. O resultado são boicotes a marcas, longas amizades desfeitas, relações familiares rompidas, cancelamentos de artistas, atletas e influenciadores.