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domingo 21 de janeiro de 2024 às 09:29h

100 anos da morte de Lenin, o revolucionário que a Rússia não quer

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Em 21 de janeiro de 1924 morria um dos homens que definiram o século 20. Putin e os seus atacam Lenin como “arquiteto da Ucrânia”. Mas na Alemanha, monumentos da era soviética ainda marcam sua presença histórica. Na Rússia, o líder do proletariado internacional Vladimir Lenin só é recordado raramente: no dia de seu nascimento ou da sua morte – ou quando Vladimir Putin o cita como “arquiteto da Ucrânia”.

Segundo o presidente russo, o país vizinho seria “o resultado da política bolchevista”. Em fevereiro de 2022, poucos dias antes de a Rússia iniciar sua guerra contra a Ucrânia, ele anunciou que ia precisar eliminar as consequências indesejadas das ações de Lenin – o qual se engajou pelo direito das nações à autodeterminação e acreditava firmemente que as culturas nacionais se extinguiriam.

O Kremlin caracterizou o revolucionário, morto em 21 de janeiro de 1924, como o “mau menino” que destruiu o grande e forte império russo. Segundo o historiador austríaco Hannes Leidinger, coautor do livro Lenin. Biographie. Neubewertung (Lenin. Biografia. Reavaliação), essa personagem é profundamente malquista por Putin e seu séquito justamente por seu caráter revolucionário.

“Lenin é o caos. Lenin é discórdia. Lenin é tudo o que a Rússia não quer em sua autoimagem”, explicita. Além disso, “é criticado por sua colaboração parcial com os alemães na Primeira Guerra Mundial, ou seja, com o inimigo”.

“E o motivo talvez mais importante da crítica é sua política de nacionalidades. Apesar de protagonista na luta de classes, no fim ele estava convencido de que a unidade dos proletários de todos os países seria restabelecida, mas que por enquanto a questão das nacionalidades na União Soviética pedia uma solução federalista. E também em seus discursos se pronunciou pela autodeterminação, até o ponto do desligamento. E agora isso é uma pedra no sapato de Putin.”

Na Rússia, Lenin foi derrubado do pedestal, enquanto figura histórica. “Por outro lado, esse Lenin permanece um monumento para a União Soviética, para a expansão do império, para o poder imperial. E na luta pelos memoriais, justamente na Ucrânia ele volta a preencher uma função que convém perfeitamente ao Kremlin”, explica Leidinger.

O morto-vivo vive

Originalmente o mausoléu de Lenin em Moscou foi erguido só provisoriamente em 1924, para dar, a todos que quisessem, a oportunidade de se despedirem dele. Contudo a despedida se estendeu significativamente, e o líder está até hoje na Praça Vermelha. Por que a liderança russa não quer sepultá-lo?

“Lenin continua tendo um certo significado, não como político ou figura histórica, mas como símbolo da União Soviética”, responde Leidinger. Há um mausoléu, porém não mais transcorrem grandes cerimônias, é uma relíquia do passado, um monumento histórico. “Mas o principal é que Lenin se encontra ainda num limbo, como uma espécie de ‘morto-vivo’, entre a despedida definitiva e seu papel de símbolo soviético. Portanto Lenin não está totalmente morto.”

O livro Lenin lebt. Seine Denkmäler in Deutschland (Lenin vive. Seus memoriais na Alemanha), publicado pela editora 8. Mai, é dedicado aos monumentos leninistas em solo alemão, alguns dos quais estão seriamente avariados e caíram em esquecimento. Seu autor, Carlos Gomes, nasceu em Portugal.

“Eu sempre tive um interesse pessoal e político na história soviética, acima de tudo na Revolução de Outubro, que tinha um grande potencial em relação aos direitos trabalhistas, das mulheres, anticolonialismo e até mesmo contra o antissemitismo. No entanto fiquei bem surpreso ao descobrir um memorial a Lenin na Alemanha, dez anos atrás. Daí nasceu esse projeto: então ele não desapareceu completamente no país.”

O memorial que Gomes descobriu em 2014 fica em Wünsdorf, Brandemburgo, onde se localizava o quartel-general das tropas soviéticas na República Democrática Alemã (RDA), de regime comunista. A partir de então, ele decidiu investigar onde estariam preservadas outras homenagens ao líder russo, como mosaicos, estátuas, placas. Em 2023 seu livro foi relançado em edição ampliada, contendo novos achados.

“Pessoalmente, me impressiona o monumento diante da antiga casa de oficiais em Wünsdorf. Ele manteve sua antiga força e irradiação, mas ao mesmo tempo fica claro que o tempo não passou por ele sem deixar marcas.” Hoje, essa é a maior estátua de Lenin da Alemanha, pois outras grandes foram retiradas de seus pedestais.

Depois de Lenin, o stalinismo

Entre os memoriais leninistas em solo alemão, alguns foram trazidos da União Soviética para a Alemanha pela Wehrmacht, as Forças Armadas nazistas, a fim de serem fundidas e utilizadas como matéria-prima para a indústria armamentista. Para Gomes, “essas estátuas não lembram apenas Lenin, mas também os crimes da Segunda Guerra Mundial”.

Sobre Vladimir Lenin (1870-1924) escreveram-se milhares de livros e dissertações. Tanto Leidinger quanto Carlos Gomes concordam em um ponto: ele não transformou apenas a Rússia, mas todo o mundo, dedicando-se com fanatismo a uma ideia e subordinando tudo a sua volta à realização dela, sem se importar com perdas.

“No geral, acho que a União Soviética é obra de Lenin. Ele lançou a pedra fundamental para a construção desse Estado. Josef Stalin, não é, no fundo, uma deturpação ou algo diferente, mas sim uma sequência lógica de Lenin”, afirma Hannes Leidinger.

“A decisão sobre para onde e por que caminhos esse país seguiria, foi tomada em outubro de 1917. Depois da tomada de poder, a questão era manter o poder.” O caminho já fora pré-traçado para muitos anos: embora gravemente doente, Lenin não tomou nenhuma decisão sobre o seu sucessor.

“De certo modo, isso se repete sempre. A liderança partidária, um pequeno grupo, é sempre obrigada a decidir quem deve guiar o país depois da morte de um líder que não preparou seu próprio substituto”, conclui o biógrafo austríaco.

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