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domingo 30 de maio de 2021 às 09:29h

10 perguntas para Ciro Lilla dono das maiores importadoras de vinhos dos Brasil

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Poucos brasileiros fizeram tanto para disseminar a enocultura quanto o empresário Ciro Lilla. Colecionador de histórias saborosas sobre a bebida, ele gosta de relembrar conforme a IstoÉ Dinheiro, como o Brasil carecia de profissionais especializados no assunto até bem pouco tempo. Uma delas é sobre um restaurante que se propunha a ter o vinho como diferencial. “Depois de ler a carta, eu perguntei ao maître se eles tinham sommelier. Ele respondeu que não, mas que o chef poderia preparar”, disse, anos depois, ao discursar durante jantar no qual foi homenageado pela Associação Brasileira de Sommeliers, entidade da qual foi fundador e primeiro presidente. Sua paixão por vinhos o levaria a adquirir, em 1991, a importadora Mistral, fundada 18 anos antes, e a montar uma segunda empresa, a Vinci, em 2009. Foi com a ajuda de Ciro Lilla que muitos restaurantes do País montaram cartas de vinho consistentes. Prestes a completar 73 anos e depois de provar milhares de rótulos, ele afirmou à DINHEIRO não ter um favorito – e nenhum que jamais beberia. “Estou sempre aberto a experimentar”.

Como a pandemia afetou os desempenhos da Mistral e da Vinci?

Ciro Lilla – O último ano foi de profunda transformação no nosso negócio. A Mistral sempre foi muito focada em restaurantes, que ficaram fechados – e alguns não conseguiram sobreviver. Por sorte, meses antes do início da pandemia nós havíamos contratado ótimos profissionais para fortalecer nossas áreas de vendas on-line e off-trade (lojas, empórios, supermercados). O dado positivo é que, com a volta dos restaurantes, estaremos bem posicionados nos três canais.

Então a empresa não se beneficiou tanto da alta do consumo de vinhos no País durante esse período?

Sem as mudanças que fizemos não teríamos aproveitado tão bem o momento, mas a pandemia, de certa forma, teve um lado positivo para o setor. O mercado era pequeno no Brasil por não haver o hábito regular do consumo em casa. E isso veio para ficar. Uma parte dos que passaram a beber vinho agora vai desenvolver o gosto. E aí o mercado todo ganha.

Além de mais garrafas, o brasileiro passou a beber rótulos mais caros?

Durante esse período houve uma infinidade de lives sobre vinho, cursos, degustações on-line. Tudo isso ajuda a criar uma cultura, amplia o conhecimento, leva as pessoas a experimentar mais coisas novas. E é natural que o tíquete evolua. Quem começa a apreciar vinhos dificilmente recua. Fica no vinho para sempre. E o gosto evolui.

O que o consumidor busca hoje no vinho?

No passado, o brasileiro se interessou pelo vinho por recomendação médica, porque são inegáveis os benefícios à saúde. Isso foi comprovado no “paradoxo francês” (estudo que relacionou o consumo regular de vinho a menor incidência de problemas cardíacos). Esse não é o caminho natural e levou a uma concentração de bebedores de vinhos tintos e de marcas conhecidas. Quando eu perguntava a uma pessoa se ela havia gostado, a resposta era “não entendo muito de vinho”. Por isso preferiam comprar rótulos famosos. Hoje, o consumidor está mais autoconfiante. Bebe mais brancos e rosé. E não é por modismo. Ele aprendeu que é bom arriscar. A graça do vinho está na diversidade. Só na Itália há 1 milhão de rótulos. Querer descobrir novidades é muito positivo.

O fato de as pessoas terem ficado impedidas de viajar foi outro fator que pesou nesse interesse maior pelo vinho?

De certa forma, o vinho é uma viagem. Por meio dele você entra em contato com uma região, uma cultura. O enoturismo tem crescido muito no Brasil e no mundo. Como a oferta de atrações é grande, muita gente encaixa no roteiro uma visita a uma vinícola, mesmo aqueles menos interessados no assunto. E ao conhecer um produtor, fazer uma degustação, o interesse aumenta. Quando a pandemia passar essa atividade será das mais procuradas pelos turistas. Por enquanto, as pessoas estão mesmo é bebendo mais em casa.

“Só na itália há mais de 1 milhão de rótulos. descobrir o próprio gosto é muito positivo”

Apesar de o vinho brasileiro estar cada vez mais reconhecido, a Mistral tem apenas um produtor nacional no catálogo. Por quê?

Quando fizemos o acordo com a Valontanno (vinícola da Serra Gaúcha), nossa intenção era manter a exclusividade. Eu decidi que não compraria de outro produtor nacional até que a marca ganhasse força. Eles estão evoluindo muito bem, com vinhos de boa aceitação da crítica, premiados e que têm mercado. Não estou fechado a outros produtores, mas ainda não encontrei o que busco.

Qual a sua opinião sobre os vinhos brasileiros de outras regiões?

Os vinhos de colheita de inverno são interessantes. Eu provei alguns muito bons. Mas tenho certa idade e sou um pouco tradicionalista. Acho essa técnica de dupla poda do vinhedo um tanto heterodoxa para o meu gosto. Mesmo assim, se eu fosse pegar um produtor nacional, seria de São Paulo.

E quantos aos orgânicos e naturais?

O vinho precisa ser bom. Quase todos os produtores que eu importo produzem de forma orgânica, mas sem fanatismo. Muitos preferem nem declarar no rótulo. Se em uma safra ruim ele precisar de algo que não se enquadre na produção orgânica pode fazê-lo. É como a mãe que prefere tratar o filho com medicina natural mas não descarta dar um antibiótico se houver necessidade. O vinho orgânico é um movimento que está dando certo, vai bem. Já o natural eu não conheço para opinar.

De que forma as mudanças climáticas estão mudando o modo de produzir vinhos?

Em algumas regiões o aumento da temperatura tem obrigado os produtores a fazer mudanças nos vinhedos, alterando a exposição para evitar que o excesso de calor queime a planta. É o que tem ocorrido em Portugal. Outros buscam plantar em áreas mais altas, ou mais frias, como no Chile. Isso hoje é possível com o avanço da tecnologia para detectar o potencial de cada terroir, usando até imagens de satélite. São adaptações que permitem ao produtor melhorar ainda mais as condições para elaborar bons vinhos.

Qual seu vinho favorito?

No caso dos tintos, sou incapaz de escolher. Estou sempre aberto e não há um único estilo, uva ou região que me agrade mais. No caso dos brancos, meus favoritos são os da Borgonha.

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