A tão aguardada viagem do governador da Bahia, Jerônimo Rodrigues (PT), à China, realizada no início deste mês, terminou sem avanços concretos sobre a construção da Ponte Salvador-Itaparica — projeto orçado em mais de R$ 12 bilhões e tido como uma das principais promessas de integração e desenvolvimento da região metropolitana da capital baiana com o Recôncavo.
A comitiva baiana foi recebida por representantes da China Communications Construction Company (CCCC), consórcio responsável pela execução da obra desde o contrato assinado ainda na gestão do ex-governador Rui Costa. No entanto, segundo fontes com conhecimento das reuniões, o clima entre os chineses foi de cautela e distanciamento.
Sinais de desconfiança
Embora não tenha havido pronunciamento oficial de Pequim sobre o recuo, analistas apontam que o momento político do Brasil pesa sobre a avaliação de risco da parte chinesa. As recentes denúncias de corrupção envolvendo figuras públicas, inclusive dentro do governo federal, sob gestão do presidente Lula da Silva (PT), têm repercutido negativamente entre investidores internacionais. A CCCC, por sua vez, já enfrentou escândalos de integridade em outros países e hoje adota políticas mais rigorosas de compliance.
“Não se trata apenas do risco financeiro, mas da reputação da empresa em mercados internacionais. Um contrato de tamanha envergadura, em um ambiente instável, pode representar mais desgaste do que ganho a longo prazo”, analisa um especialista em relações Brasil-China que preferiu não ser identificado.
“Eles não querem arriscar reputação em um contrato onde há risco de interferência política, insegurança jurídica e possível exposição a escândalos. E infelizmente o Brasil, nesse momento, transmite esses sinais”, afirmou um consultor internacional que acompanha projetos de infraestrutura no eixo Ásia-América Latina.
Silêncio e otimismo oficial
A Secretaria de Comunicação do Governo da Bahia emitiu uma nota minimizando o insucesso das negociações. O comunicado destacou “avanços no diálogo e fortalecimento das relações bilaterais com o governo chinês”, mas não detalhou quaisquer prazos ou compromissos concretos em relação à retomada da obra.
Nos bastidores, contudo, conforme apurou o #Acesse Política, há frustração com a falta de definições. A obra, que chegou a ter início simbólico em 2021, está paralisada desde então, e já consumiu milhões em estudos e preparação. A ponte, com 12,4 km de extensão, é considerada uma das maiores promessas de infraestrutura do Nordeste e tem potencial para transformar o turismo e o escoamento de produção local. O chamado ‘vetor do desenvolvimento’ na Bahia, ainda é só um ‘sonho’ ou ‘pesadelo’.
ACM Neto: “20 anos de promessas vazias”
A falta de progresso foi duramente criticada por ACM Neto (União Brasil), ex-prefeito de Salvador e principal nome da oposição no estado. Segundo ele, o governo do PT na Bahia “fala em construir a ponte há mais de 20 anos e absolutamente nada foi efetivado de fato.”
“É sempre a mesma novela: anunciam, fazem viagens, tiram fotos, e no final não saem do lugar. A ponte virou uma promessa eleitoral reciclada a cada ciclo. O povo já não acredita mais”, afirmou ACM Neto em entrevista à imprensa local, ressaltando que a Bahia precisa de “gestão eficiente, não de marketing político”.
A crítica de Neto vem ao encontro do sentimento de frustração de parte da população, especialmente nas regiões que seriam diretamente beneficiadas pela ponte, como a Ilha de Itaparica e municípios do Recôncavo. Para muitos, o projeto já se tornou um símbolo do que não avança na infraestrutura baiana.
Incertezas
Além da desconfiança internacional, o projeto enfrenta questionamentos dos baianos. Moradores e empresários da Ilha de Itaparica e região seguem na expectativa. “O discurso é bonito, mas a ponte virou lenda”, afirma João Freitas, comerciante local.
A viagem à China, que deveria ser um marco de reativação da confiança internacional no projeto, acabou sendo mais um capítulo de incertezas no longo caminho entre Salvador e Itaparica.