A recente votação da resolução que suspende a ação penal relacionada aos atos de 8 de janeiro de 2023 escancarou o embate entre os Poderes em Brasília. A articulação foi conduzida pelo presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), que, segundo aliados, buscava responder às recentes decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) que, em sua avaliação, têm avançado sobre prerrogativas do Legislativo.
Nos bastidores, Motta confidenciou estar incomodado com o que considera uma “intromissão precoce” do STF em temas internos da Câmara, como a liberação de emendas parlamentares e a própria resolução que suspende a ação penal. Antes mesmo da votação, a Primeira Turma do Supremo havia se posicionado contra a medida, enviando um comunicado à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) alegando sua inconstitucionalidade.
Apesar de reconhecer, entre interlocutores, que a resolução “não vai dar em nada” e será barrada pelo Supremo, Motta optou por levá-la ao plenário, numa estratégia para transferir ao Judiciário o desgaste com os parlamentares aliados ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). O gesto veio após ele ter brecado a tramitação do projeto de anistia aos envolvidos nos atos golpistas de 8 de janeiro, gerando críticas internas do PL, partido que apoiou sua eleição à presidência da Câmara.
Além das tensões com o STF, pesou também a irritação de Motta com a condução do ministro Flávio Dino diante das declarações do líder do PL, Sóstenes Cavalcanti, sobre a divisão de emendas de comissão — episódio que acirrou ainda mais o clima entre Legislativo e Judiciário.
Do lado do Supremo, a reação foi rápida. O presidente do STF, Luís Roberto Barroso, encaminhou o texto da resolução para o ministro Cristiano Zanin, relator do caso na Primeira Turma. A medida já está pautada para julgamento no plenário virtual entre os dias 9 e 13 de maio, a pedido do ministro Alexandre de Moraes. A tendência é de rejeição unânime, com base em três fundamentos jurídicos principais: a limitação do alcance da imunidade parlamentar, a tentativa de estender efeitos da medida a réus sem foro privilegiado e o fato de a suspensão atingir o ex-presidente Jair Bolsonaro, cuja situação jurídica exige tratamento distinto.
A movimentação da Câmara representa, mais uma vez, a tensão latente entre os Poderes. Ao mesmo tempo em que busca reafirmar sua autonomia, o Legislativo se vê pressionado a responder aos seus próprios grupos de apoio, especialmente os ligados ao bolsonarismo, em um cenário em que o equilíbrio institucional segue sendo testado.