quarta-feira 16 de julho de 2025
O presidente da Câmara, Hugo Motta, durante evento — Foto: Cristiano Mariz/Agência O Globo/02-04-2025
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segunda-feira 16 de junho de 2025 às 15:08h

Congresso bate recorde de projetos para barrar decisões do governo Lula

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Projetos para derrubar decisões do presidente da República dispararam nos últimos anos, em sinal de um Congresso Nacional cada vez mais arisco ao Poder Executivo. Poder Executivo. De 1995 a 2025, deputados e senadores apresentaram mais de 3,4 mil propostas para sustar atos e normas da presidência — mais da metade só nos governos de Jair Bolsonaro (PL) e Lula da Silva (PT).

O levantamento, obtido com exclusividade pelo Estadão, foi realizado pelo cientista político e especialista em Poder Legislativo Murilo Medeiros, da Universidade de Brasília (UnB). De acordo com Medeiros, nesse período de 30 anos, apenas 0,2% (10) dos projetos apresentados foram aprovados. Apesar disso, ele explica que o ato de apresentar um Projeto de Decreto Legislativo tem o poder de intimidar o Palácio do Planalto, de forma a pressionar o Executivo a recuar em seus atos normativos.

Foi o que aconteceu com o decreto do governo Lula que elevou a alíquota do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), um tributo federal que incide sobre diversas operações financeiras. A medida encontrou forte resistência no Legislativo, que protocolou 28 PDLs para suspender a norma, levando o governo a recuar e editar um novo decreto que suavizou o aumento inicialmente previsto. Ainda assim, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), anunciou que a Casa votará nesta segunda-feira, 16, um requerimento de urgência para derrubar esse segundo decreto.

“O Projeto de Decreto Legislativo destinado a sustar normas do Poder Executivo é um eficiente instrumento de controle parlamentar, capaz de emparedar o governo”, diz Medeiros, que acrescenta: “A mera apresentação do PDL pode provocar incentivos suficientes para que o governo abra mão de levar adiante um ato normativo que o Legislativo manifeste sinais de que vai derrubar, como o caso do decreto do IOF.”

Os Projetos de Decreto Legislativo são previstos na Constituição Federal e dão ao Congresso o poder de suspender atos unilaterais do presidente da República que ultrapassem os limites legais. Além disso, podem ser usados para aprovar acordos internacionais e autorizar ou renovar serviços de radiodifusão — mas esses casos não foram levados em consideração para o levantamento.

Como mostrou o Estadão, desde 1988 o Congresso só conseguiu, de fato, derrubar decretos presidenciais por meio de PDLs em duas ocasiões: uma em 1989, no governo José Sarney, e outra em 1992, na gestão de Fernando Collor.

Apesar da baixa taxa de aprovação, de 0,2%, o uso desse instrumento de pressão cresceu de forma exponencial nos últimos anos. Segundo os dados compilados por Medeiros, só no governo Jair Bolsonaro foram protocolados 1.506 Projetos de Decreto Legislativo. No atual governo Lula, já são 662. Juntos, Bolsonaro e Lula III concentram 63% de todos os PDLs protocolados nas últimas três décadas.

O governo Temer é o terceiro da lista, com 336 PDLs apresentados, seguido do segundo mandato de Dilma Rousseff (294).

Veja a tabela completa abaixo:

“Lula enfrenta um quadro político distinto de seus governos anteriores. Entre 2003 e 2010 (Lula I e II), deputados e senadores apresentaram 256 projetos de decreto legislativo para sustar atos normativos do presidente da República. Agora, no governo Lula III, já foram identificados 662 PDLs – aumento de 158%”, diz Medeiros.

O salto recente nos PDLs, porém, não se deve apenas ao volume de normas editadas pelo governo federal. Para o cientista político Vinícius Alves, professor do IDP-SP, o fenômeno reflete uma mudança estrutural na relação entre Executivo e Legislativo, resultado da fragmentação partidária e do fortalecimento institucional do Congresso após reformas constitucionais recentes.

“Neste sentido, o aumento na frequência dos PDLs pode sim ser visto como parte dessa estratégia de afirmação institucional do Legislativo”, afirma.

No governo Bolsonaro, o avanço dos PDLs, diz Alves, esteve associado ao estilo de enfrentamento e à baixa disposição para negociar com o Congresso, cenário que levou o presidente a editar normas sem articulação prévia, provocando reações imediatas do Parlamento.

Já no caso de Lula III, o desafio se dá em outro plano: diante de uma base mais fluida e de um Congresso de perfil majoritariamente conservador, há menor margem para controle da agenda, o que torna mais frequente o uso dos PDLs como resposta a medidas unilaterais do Planalto.

“O presidente se vê diante de um Legislativo empoderado e fragmentado, em sua maioria mais distante do espectro ideológico do partido que lidera o governo, em contexto de ainda forte divisão e hostilidade entre grupos adversários, o que certamente dificulta o processo de negociação política e construção de consensos”, completa.

Até a base tenta derrubar decretos

Apesar de ser visto como um instrumento da oposição, o PDL também tem sido usado por partidos da base do governo Lula. Apenas em 2025, parlamentares do PT (1), PSB (1), PDT (3) e PSOL (2), todas siglas aliadas, apresentaram 7 PDLs para sustar atos do governo. Partidos de centro, como MDB (8), Podemos (9) e PSDB (1), protocolaram ao todo 18 PDLs. Já legendas de centro-direita que integram ministérios no atual governo, como Republicanos (19), PP (15) e União Brasil (12), somaram 46 PDLs.

Na prática, o avanço de um PDL em apenas uma das Casas já tem sido suficiente para forçar o governo a recuar. Além do caso do decreto do IOF, houve episódios como o de 2023, quando a Câmara aprovou a suspensão de dois decretos de Lula que alteravam a regulamentação do marco legal do saneamento básico. Para evitar derrota no Senado, o Executivo revogou os decretos e editou novas regras.

Situação semelhante ocorreu durante o governo Jair Bolsonaro, quando o Senado aprovou um PDL que derrubava o decreto presidencial que flexibilizava regras para posse e porte de armas. Antes que a Câmara analisasse o projeto, Bolsonaro revogou os decretos questionados e editou novas normas sobre o tema, o que levou ao arquivamento do PDL.

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