Entre agosto e setembro, saíram da fila do INSS 41.871 processos, o que reduziu o estoque de pedidos para 1,63 milhão. Mas outra lista de espera quase invisível segue crescendo: a de recursos, quando o trabalhador tem o benefício negado e recorre administrativamente da decisão. Segundo dados do INSS, estão nesta fila conforme Geralda Doca, do O Globo, mais 1,65 milhão de trabalhadores. Em maio, ela estava em 1 milhão.
Quando um trabalhador faz um pedido ao INSS, ele vai para a fila inicial. Se o pedido for recusado, ele pode fazer uma solicitação para revisão dessa decisão. Caso a negativa seja mantida, o trabalhador pode entrar com um recurso para o Conselho da Previdência. Foi essa segunda fila que cresceu neste ano, apesar das promessas do governo para agilizar a análise das solicitações dos benefícios. O 1,65 milhão de processos que estão na fila de recursos considera tanto os que já estão no Conselho como também os que ainda ainda sendo processados.
Somadas as duas filas — pedidos iniciais para reconhecimento de direito a benefícios e os recursos — são 3,28 milhões de pessoas à espera de uma resposta da Previdência Social. Esses processos se referem a solicitações de aposentadoria, Benefício de Prestação Continuada (BPC, voltado para idosos e pessoas com deficiência pobres), salário-maternidade, pensão por morte, auxílio-reclusão, auxílio-doença e auxílio-acidente.
Se forem computados todos os processos abertos no INSS, como certidão de tempo de serviço, atualização de cadastro, ajuste de guia, demandas judiciais, seguro defeso (pescadores artesanais), dentre outros, a fila sobe para quase 7 milhões.
Anos de processo
Apesar da aparente facilidade para pedir o benefício ao INSS — como o aplicativo da instituição e a internet — a rejeição principalmente de aposentadorias e do BPC acaba empurrando as pessoas para a fila de recursos. Trabalhadores afetados dizem que há situações em que os documentos não foram analisados corretamente ou rejeição por falhas cometidas pelo interessado, como não usar o campo certo para preencher dados.
— Tive problema sério de saúde e precisei continuar trabalhando — queixou-se.
A atendente de telemarketing Ana Cristina Silveira também está na fila do recurso há quase dois anos. Ela teve o pedido da aposentadoria atendido, mas disse que recorreu por discordar do valor do benefício, em torno de um salário mínimo. Com 55 anos, ela diz que trabalha desde 14 anos de idade.
— Agora completei 41 anos de serviço. Estou esperando uma decisão para poder parar e descansar um pouco — disse Ana Cristina, que também teve que recorrer a um advogado para acompanhar o processo.
Para o vice-presidente do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP), Diego Cherulli, é importante reduzir a fila inicial, mas de nada adianta se os processos não são analisados adequadamente e acabam levando os casos para recursos.
— O governo precisa atacar todas as filas da Previdência.
O Conselho de Recursos é ligado ao Ministério da Previdência e funciona de forma independente do INSS. É formado por representantes do governo, dos trabalhadores e empregadores e é constituído por 29 juntas de julgamento nos estados, quatro câmaras e o conselho pleno.
Judicialização aumentou
Segundo o ex-presidente do INSS Leonardo Rolim, em caso de dúvidas na concessão do benefício, os servidores optam por negar o pedido porque temem responder processo administrativo. Por isso, destacou, é importante ter um Conselho eficiente para evitar maiores problemas aos cidadãos e às contas públicas devido aos custos com pagamento de benefícios de forma retroativa à data de entrada.
— Infelizmente o Conselho de Recursos tem uma dificuldade grande de conseguir julgar rapidamente — constata.
Diante da lentidão do Conselho, as pessoas vão direto ao Judiciário. Os dados do INSS mostram que os benefícios obtidos via Justiça passaram de 1% do total de concessões em 2001 para 13% em 2020; 14,9% em 2022 e, neste ano, saltou para 16,2%.
Com as críticas recorrentes à fila do INSS, os governos anterior e atual tomaram algumas medidas, como pagamento de bônus para servidores analisarem processos fora do expediente. Em agosto, foi aberto um edital para contratar 305 conselheiros. Mas, para Cherulli, as medidas não são suficientes. Ele afirma que seriam necessários pelo menos o dobro de conselheiros e mais seis mil servidores no INSS, além de um sistema de avaliação da eficiência do serviço prestado.
— A avaliação existente é restrita às concessões efetivadas — observou Cherulli.
Procurado, o Ministério da Previdência informou apenas que existem na fila de recursos 790 mil processos. Mas esse número não considera os recursos que estão no INSS e ainda não foram remetidos ao Conselho.
O INSS disse que o órgão e o Ministério da Previdência têm tomado uma série de medidas para reduzir a fila de requerimentos, como a realização de mutirões, troca de perícia médica presencial por análise documental, simplificação do uso do Meu INSS, busca ativa por segurados que aguardam perícia médica e recepção de documentos médicos sem a necessidade de agendamento.