Em uma corrida contra o tempo, a Câmara dos Deputados aprovou ontem mais R$ 10 bilhões em crédito para micro e pequenas empresas. Para os empresários, os recursos devem chegar em boa hora e podem motivar uma nova corrida aos bancos em busca de financiamento, como ocorreu nas primeiras duas etapas do programa. Apesar do período de fim de ano, nos setores de comércio e serviços, muitos se queixam de que a demanda não avançou como o previsto em razão do aumento de casos da Covid-19 e dos efeitos da crise econômica.
O dono da rede de restaurantes Bom Galeto, Alcides Monteiro Neto, percebeu que o movimento não subiu como o esperado nas últimas semanas nos restaurantes que ficam nas ruas e na unidade em shopping. Para ele, isso é resultado da combinação de desemprego alto, perspectiva de fim do auxílio emergencial e inadimplência:
— Desde a reabertura, crescemos mês a mês e estávamos com uma expectativa grande em dezembro, quando, geralmente, aumentamos as vendas em torno de 40% na comparação com novembro. Mas, desta vez, está sendo bem diferente. As pessoas estão segurando mais o dinheiro ou simplesmente não têm.
Durante o ano, ele obteve crédito na segunda fase do Pronampe e usou a verba para pagar contas atrasadas, folha de pagamentos e impostos.
Versão descentralizada
Para 2021, o governo vai colocar de pé uma espécie de versão descentralizada do Pronampe. Trata-se de um sistema para incentivar bancos a concederem crédito a micro e pequenas empresas por meio de cooperativas financiadas por estados, municípios e entidades empresariais. A ideia é facilitar empréstimos a negócios de pequeno porte, após o fim do Pronampe.
A proposta agora é fazer com que a oferta de recursos esteja mais próxima do pequeno empresário ou do empreendedor. Batizado de Sistema Nacional de Garantias, o novo plano do governo federal prevê que cada estado, cidade ou região tenha uma instituição chamada de cooperativa de garantia. Empreendedores poderão recorrer a entidades para garantir crédito junto aos bancos.
O aumento de casos de coronavírus já afeta a trajetória de recuperação de alguns empreendimentos. No restaurante Margutta, o sócio Giorgio Neroni diz que novembro foi o pior mês de todos os 26 anos da casa.
— Vínhamos de uma recuperação, trabalhando bem o delivery, o salão estava indo bem e veio o aumento de casos. Começamos a sentir no início de novembro que a frequência caiu em torno de 20%. Temos um público de pessoas com mais idade e que, no isolamento social, saem da cidade para suas casas de campo e praia — diz Neroni.
A loja Fernanda Chies, em Ipanema, tem clientela que faz compras presenciais. Ela vinha se recuperando e voltado a vender roupas de festas.
— O Natal realmente aumentaria o fluxo, investimos em mercadoria. Mas houve aumento de casos e trouxe um impacto que estamos sentindo com força. O fluxo presencial diminui muito. Temos feito as vendas pelo WhatsApp, enviando fotos de roupas. Muitas clientes estão com medo de ir para a rua — conta a proprietária da marca que leva seu nome, Fernanda Chies.
Decreto no início de 2021
O modelo de cooperativa de garantia que o governo planeja será uma nova versão de uma instituição existente, mas pouco conhecida, a Sociedade de Garantia de Crédito (SGC). A principal novidade é a integração das entidades ao sistema financeiro nacional. Segundo o governo, isso facilitará que sejam financiadas por agentes como governos locais, instituições como Sebrae e associações empresariais.
— Se você tem uma central de garantia do Paraná, o estado do Paraná pode prever que os recursos fomentem apenas operações de microempresas do Paraná — diz a subsecretária de Desenvolvimento das Micro e Pequenas Empresas, Empreendedorismo e Artesanato do Ministério da Economia, Antonia Tallarida.
Em última instância, o governo federal garantirá as operações, mas não injetará recursos de antemão, como no Pronampe. O Tesouro Nacional atuará para garantir as cooperativas.
Atualmente, as SGC oferecem garantias para empreendedores que buscam crédito junto a instituições financeiras. No entanto, o Ministério da Economia avalia que, por não fazerem parte do sistema financeiro, essas cartas não são bem recebidas pelos bancos.
O sistema nacional de garantias está previsto na lei do Simples Nacional, mas nunca foi regulamentado. A ideia é publicar um decreto no início de 2021 para dar segurança jurídica e fazer a regulamentação por meio do Conselho Monetário Nacional (CMN).
A subsecretária destaca que é um trabalho de médio prazo, pois necessitará de divulgação para estados e municípios.